Cordelirando...

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

ASSÉDIO MORAL NO MUNDO ACÃODÊMICO: O CASO DA UFBA!


 ASSÉDIO MORAL NO MUNDO ACÃODÊMICO: O CASO DA UFBA!

 


Este cordel é um grito
Que precisa ecoar
Não pode ficar restrito
Preso em qualquer lugar
É pedido de socorro!
Mas também é um esporro
Em quem tenta nos calar


É um texto fruto da dor
E da indignação
Contra o psicoterror
- esta forma de opressão -
Que no mundo laboral
E na luta sindical
Merece muita atenção!


Leciono sobre o tema
Pesquiso e sofro também
Posso falar, sem problema
Em verso, prosa e além
Pois o assédio moral
Tem causado muito mal
Pra quem não lhe diz amém


Trata-se de uma conduta
De caráter abusivo
Que emerge na labuta
Em espaço educativo
Mas onde quer que se dê
Faz muita gente sofrer
De modo superlativo


Seja por hostilidades
Gestos ou comportamentos
Que atingem a dignidade
Do alvo em cada momento
Mexe com o emocional
No contexto funcional
Gera dor e sofrimento


Sobre causas/consequências
Existem alguns consensos
Nas variadas ciências
E seus estudos mais densos
Sobre múltiplos fatores
Todos favorecedores
De aguerridos dissensos


Porém nem todo conflito
Gera assédio moral
Mas o que deixa implícito
Que somente o maioral
Que concentra o poder
Pode, a seu bel-prazer,
Destruir o seu “rival”


É sobre dominação
Controle e violência
É sobre perseguição
Isolamento e ofensa
É sobre impunidade
Conivência e falsidade
Onde o assédio compensa


Desigualdade entre pares
Concorrem para a mazela
Privilégio seculares
Também promovem querelas
Além do autoritarismo
E do patrimonialismo
Que sempre deixam sequelas


Quando grupos hegemônicos
Se encastelam no poder
Com seus discursos icônicos
Que fazem o mundo tremer
Ninguém mais pode falar
E tampouco questionar
O que é preciso rever


Coitado de quem ousar
Tentar pedir transparência
Ou de quem sinalizar
Que há falta de coerência
Entre o dito e feito
Ou reivindicar direitos
Com firmeza e persistência


Muitas pesquisas existem
Sobre o modus operandi
E como os alvos resistem
Enquanto o terror se expande
E quais medidas tomar
Ou a quem denunciar
No seio da Casa Grande


No universo acadêmico
A prática é super comum
É fenômeno epidêmico
Não é mero zunzunzum
Na UFBA é alarmante
Pois os dados são gritantes
Mas não há socorro algum


Além dos casos que listo
No livro que eu lancei
Para falar sobre isto
Muitos anos estudei
Por isso posso dizer
Aqui é grande o sofrer
E sinceramente cansei!


Cansei de pedir que apurem
Os fatos que já narrei
E que a mim assegurem
Provar que há foras-da-lei
Que agem como bem querem
Em um núcleo de mulheres
Que são amigas do Rei


E como tal se autorizam
Perseguir e isolar
Quem elas não simpatizam
Ou não se deixa domar
Por membros da panelinha
Que formam a igrejinha
Onde ninguém pode entrar


Cansei de ser preterida
Excluída e massacrada
Mesmo frequente na lida
Raramente mencionada
Cansei de ser correria
Reclamando isonomia
E sendo a mais cancelada


Cansei de solicitar
Acesso a informações
Cansei de identificar
Manobras em decisões
Sobre banca de concurso
Sobre exclusão de discurso
Em várias reuniões


Cansei de questionar atas
Raramente fidedignas
Cansei de ouvir bravatas
Em nome de uma consigna
Cansei de ver feministas
Ferrando outras, às vistas
De quem ainda se indigna


Cansei do epistemicídio
- o eterno apagamento -
Usei do sincericídio
Quando chegou o momento
Cansei da inobservância
De regras d’outras instâncias
Em nome de um sacramento


Cansei de ter prejuízos
Em minha vida laboral
Enquanto vivem aos risos
Quem me persegue, afinal
Sendo que a Ouvidoria
Correição e Reitoria
Acham que tudo é normal


Cansei de ver conivência
Omissão e faz-de-conta
Para além de leniência
Que também é uma afronta
Ao sofrimento de quem
No jogo do vai e vem
Vive qual barata tonta


Diante de uma gestão
Que premia agressoras
E não faz apuração
Adequada e sem tesouras
Pois recorta o que convém
E arquiva com desdém
Denúncias já duradouras


Há falta de compromisso
Em enfrentar o problema
E um reitorado omisso
Só fortalece o esquema
De quem não quer resolver
Mas sim nos enlouquecer
Eis o seu estratagema


Sem ter a quem recorrer
Vítimas seguem descrentes
Umas pensando em morrer
Outras bastante doentes
Algumas se exonerando
Se aposentando ou migrando
Ou se tornando silentes


São estratégias diversas
Onde falta providência
É uma postura perversa
Onde se produz ciência
Às vítimas só sofrimento
À quem viola, incremento
Para nutrir prepotência


Falta o acolhimento
A empatia e o cuidado
E também o investimento
Em um projeto integrado
Dos setores entre si
Que às vítimas possam ouvir
Sem ficar do lado errado


Falta ver quem tem pautado
O problema há muito tempo
Ou quem tem vivenciado
Um inferno sem alento
Falta querer acabar
Um modus de triturar
Mentes em grande tormento


E por fim falta o apoio
Do sindicato omisso
Que agora em tempo de aboio
Finge que tem compromisso
Mas justo nesta eleição
As chapas mostram que estão
Com a “turma do deixa disso”.


De um lado, a chapa um
Pra quem deseja um abraço
E ganha um assédio comum
Cheio de fitas e laços
Do outro, a chapa dois
Do assédio feijão com arroz
Que eu já conheço um pedaço


Em ambas há “neinetes”
Pra quem quiser escolher
Dois lados de um cotonete
Pra quem aceita viver
Seguindo o mesmo jogo
Seja com água ou com fogo
O assédio não vai perder


Perdemos nós, suas vítimas,
Mas elas não perdem não
Pois sempre são as legítimas
Representantes dos sãos
Enquanto as encrenqueiras
Loucas, débeis, maloqueiras
Seguem gritando em vão


E lá se vão alguns anos
De uma luta inglória
Reitorado passa-pano
Premia e concede glória
Mantendo a velha estrutura
Nutrida pela cultura
Governança-predatória


Seja na Câmara Técnica
Ou instâncias decisórias
Discursam em nome ética
Com eloquente oratória
Todo mundo acomodado
Banhado e perfumado
Como é linda essa vitória!


Com assédio institucional
O desfecho é mais bonito
Pode até ser um sinal
De um futuro veredito
Onde toda a estrutura
Ganha mais envergadura
Contra a Maria Palito.


Eis o tal mundo Acãodêmico
Onde não há bem-estar
Onde quem fala é polêmico
Doente ou impopular
E as relações de poder
São uma máquina de moer
Quem ousar questionar


Porém em dia de festa
Falam em saúde mental
E fazem até seresta
Quando é chegado o Natal
No mais, é só violência
Que permeia a ciência
Que vai pra vida real


Antes fosse um pesadelo
Um sonho um tanto ruim
Mas esse é o modelo
E querem pra sempre assim
Discordo e não aceito
Por isso tô desse jeito
Nessa Torre de Marfim


Mas como uma outsider
- uma estrangeira lá dentro-
Que não sabe jogar spider
E nem ocupa o centro
Só quero que outras vítimas
Saibam que a luta é legítima
E há mais descontentamento


E que há outros feminismos
Que pensam um outro poder
Aquele poder de dentro
Que não deixa esmorecer
As vozes tão calejadas
Que jamais ficam caladas
Pois nascem com o alvorecer!


Salvador, 08/11, 2024.

Profa. Salete Maria/UFBA

segunda-feira, 25 de março de 2024

Coletânea: 30 anos de cordéis feministas e libertários - GRATUITA!



Recém saída do forno a Coletânea Cordelirando, obra comemorativa dos meus 30 anos de Cordéis feministas e libertários! Nossos agradecimentos a todas as pessoas que contribuíram para que esta obra viesse à luz e para que o seu acesso gratuito fosse possível. Quem  desejar colaborar para a produção do documentário, fique à vontade! Desfrutem das mais de 700 páginas de pura poesia.

Segue o link para acesso gratuito desta obra: 

Link para acesso ao livro!

At.te, Salete Maria. Salvador, 25/03/2024. 

Post script: em breve faremos recital coletivo virtual e presencialmente.
 

domingo, 10 de dezembro de 2023

Uma questão de Justiça?

Imagem: Google Imagens


Todo mundo está feliz
Com a notícia alvissareira
Das cotas de aprendiz
Para a “turma babadeira”[1]
Que o TêJóta Bahia
Anunciou com euforia
Como a conquista primeira


Primeira entre os tribunais
Do Cistema de Justiça
Que fala em “todos iguais”
Mas teve postura omissa
Ao largo de tantos anos
Em que gays eram profanos
E transgêneros mundiça


Sem dúvida, é um avanço
Uma conquista histórica
Da qual faremos balanço
Após a fase eufórica
Mas é preciso dizer
Que pra isto acontecer
A luta foi diaspórica


Pois houve o afastamento
De natureza forçada
De um magistrado sedento
Por ver a pauta adotada
No seio do tribunal
Que agora dá o aval
De “causa justa e adequada”


O joio foi separado
Do trigo que alimenta
Um Cistema autocentrado
Que sempre regulamenta
De forma impessoal
Asséptica e correcional
E com “postura isenta”


Depois de um quiprocó
Que gerou penalidades
E a cúpula agiu sem dó
Empatia ou boa-vontade
De abrir a discussão
E aprimorar a questão
“Dentro da legalidade”


Ainda que “o legal”
Seja eivado de exclusão
E o corpo institucional
Aprecie a discrição
Que enaltece o armário
Do qual um gay dito Mário
Saiu sem pedir perdão


Nossos estudos apontam
Que a dissidência é malvista
Pois outsiders afrontam
Ethos corporativistas
Seja errando ou acertando
Uma vez incomodando
A dissonância é malquista


Sobretudo no Estado
Em seu setor mais hermético
Onde “o outro” é rechaçado
Ou visto como herético
E as “novas teorias”
Quando encontram simpatia
Sofrem câmbios sincréticos


Mas não para promover
Mudanças estruturais
E sim para atender
Interesses maiorais
De forma utilitarista
Via discurso simplista
Para caber nos jornais


Assim tem acontecido
Com conceitos feministas
Com fundamentos tecidos
Em tradição marxista
E com outras epistemes
Que se convertem em memes
Flagrantemente racistas


Por isso que é importante
Saber a origem das lutas
Já que a qualquer instante
Batalhas ficam ocultas
Dentre outras narrativas
Muito mais celebrativas
De figuras impolutas


E como eu faço cordéis
Sobre seres invisíveis
Sobre os ditos infiéis
Aos sistemas corrompíveis
Mesmo feliz com a conquista
Não posso perder de vista
O lugar dos inaudíveis


Por isso quero lembrar
Que a ação afirmativa
Que estamos a celebrar
De forma mui efusiva
Teve também sua luta
Recheada de disputa
Nem sempre tão inclusiva


Afinal o embrião
Que gerou regulamentos
Nem sempre teve a atenção
Ou mesmo o acolhimento
Dos, hoje, pais da criança
Que nasceu da esperança
De quem segue em sofrimento


Resgatemos a história
Sem animus de heroísmo
Puxando pela memória
E fazendo paralelismo
Entre o jogo do poder
E o modo de proceder
De quem se joga no abismo


No começo deste ano
Um juiz gay avançou
O front do soberano
E o tribunal rejeitou
Um edital que dizia
Que em sua cercania
Excluídos tem valor


O juiz propugnava
Que o grupo élegêbêtê
Na Vara que coordenava
Pudesse se inscrever
Pra função de estagiário
Desde que legitimário
Do certame a se fazer


No edital redigido
Exclusivo para a sigla
Três vagas davam sentido
À inclusão pretendida
Conforme os indicadores
E os princípios reitores
Da ética da acolhida


Considerado absurdo
Seu projeto não vingou
Pois um juiz mais graúdo
De pronto o rechaçou
Alegando inconsistência
Pois via uma incoerência
Héteros fora do gol


Invocando competências
E políticas de gestão
Também o Cê-ene-jóta
Disse, na ocasião,
Que caberia ao Têjóta
Enquanto dono da bota
Pisar firme neste chão


Aí o caldo engrossou
E o tema-tabu saiu
Das hostes do tribunal
E muito repercutiu
Nas tais mídias sociais
Assim como nos jornais
Desta pátria-mãe-gentil


E como manda quem pode
E quem não pode resiste
Quem tem dente sempre morde
Quem não morde então persiste
O juiz foi processado
E “cautelarmente afastado”
Dentro deste enredo triste


Neste contexto o silêncio
Foi eloquente entre pares
Tal qual um pacto prudêncio
Noutros campos similares
Movimentos aguerridos
Núcleos antes destemidos
Nem um gemido aos mares


Nem mesmo autoridades
Que falam de exclusão
Heteronormatividade
E sistemas de opressão
Nadica de nada disse
Como se fosse tolice
Tratar da situação


E olhe que os Cistemas
Tem seus nichos específicos
Com estruturas e temas
Palestrantes magníficos
Mas diante da questão
“De conflitos de gestão”
Ninguém “escuta” o não dito


Que envolve identidades
E modos de se portar
Onde a domesticidade
É critério para estar
Em condição de respeito
Ou sujeito de direitos
Que mereça este lugar


Quem estuda abjeção
Gênero e sexualidades
Fazendo articulação
Com regimes de verdade
Olha pro Judiciário
E seus jogos de contrários
E percebe iniquidades


Ninguém em sã consciência
Nega o currículo oculto
Que orienta Excelências
A lerem seus estatutos
Recusando as rupturas
E acomodando em molduras
Tentativas de tumulto


Foi isto o que aconteceu
Seguindo um mesmo padrão
Pois muito já se escreveu
Sobre tal situação
Governamentalidade
Versus subjetividade:
Outras formas de prisão!
 

É assim que o mundo gira
E às vezes gira ao contrário
Agendas saem da mira
Mas voltam noutro cenário
E o que outrora era ruim
Agora recebe o “sim”
Num casamento em plenário


E em pleno “mês de pedágio”
O Tribunal aprovou
Nova política de estágio
Que ao “grupo T”contemplou
Mas quando aos jornais falaram
De modo algum mencionaram
O juiz que a inaugurou


Nem mesmo colegas dele
Fizeram qualquer menção
Nenhum reconhecimento
Na augusta ocasião
Em que foi anunciado
O decreto proclamado
Pelo gestor de plantão


Reconhecer os esforços
Pra promover a inclusão
E superar os caroços
Da tal discriminação
Requer jogo de cintura
Mas também outra postura
Que não endossa exclusão


Representatividade
Importa em qualquer lugar
Mas também honestidade
Pra história não apagar
Pois quem foi sempre excluído
Confere um grande sentido
À luta que quer travar


Como gênero-dissidentes
Poderão compreender
Uma política de cotas
Que não lhes dá a saber
Que houve um magistrado
Que agindo certo ou errado
Lutou para acontecer?


Aqui eu estou falando
De apagamento epistêmico
Pois o estou vivenciando
E o vejo a todo momento
Já que se trata de um fato
Onde o termo “ingrato”
Não dá conta do evento


O apagamento em questão
Quando ao queer destinado
Envolve a negação
Do esforço empregado
Assim como seu talento
Labor e conhecimento
Sempre invisibilizado


Gera o epistemicídio
Que consiste em aniquilar
O saber do “entendido”
Que de si ousa falar
E no caso do juiz
Ele arranhou o verniz
Do poder que quer brilhar


Eu menciono a medida
Que o tribunal adotou
E que deve ser aplaudida
Desde que haja o rigor
Em reconhecer a luta
E o contexto da disputa
Que o embrião gerou


Pois as lutas por direitos
Dos grupos minorizados
São pontilhadas de pleitos
E embates acalorados
Muita tensão e estresse
Pois jamais houve benesse
Da parte dos potentados


Assim foi com as mulheres
Que bravamente lutaram
Metendo suas colheres
Nos pactos que as ocultaram
E ao exigirem direitos
Mostraram os preconceitos
Que as inferiorizaram


Com outros grupos humanos
O mesmo aconteceu
Negros, migrantes, ciganos...
O Estado nada lhes deu
Tudo foi fruto de lutas
De delongadas disputas
Que a história sempre escondeu


Indígenas estão “em guerra”
Há mais de 500 anos
Por demarcação de terras
E contra tantos desmandos
Que agridem sua cultura
Mas deles cobram candura
No trato com “educandos”


Também demandam direitos
Idosos, pobres, doentes
Todos eles com seus pleitos
Que merecem outras lentes
Privados de liberdade
Lutam contra iniquidades
De autoridades silentes


Sem tetos e sem estudos
PCDs, desempregados
Já não temem os graúdos
Que comandam o Estado
Elevam a sua voz:
“Nada sobre nós sem nós”
E seguem encorajados


Mulheres negras, indígenas
Dos campos, mares, florestas
Tidas como alienígenas
Seguem alargando frestas
Nos espaços de poder
Onde as trans mal podem ver
Quem participa das festas


Por isto que é importante
Que a luta coletiva
Não pare um só instante
E siga bastante viva
Mas que também reconheça
Para que ninguém esqueça
Personagens decisivas


Tal qual o juiz Caymmi
Que ousou iniciar
Um projeto que imprime
Outro modo de pensar
Quando era do COGEN[2]
Ambicionou ir além
De um modo de gestionar


E considerando a proposta
Do juiz gay resistente
Que ousou fazer aposta
Para gênero-dissidentes
E em edital pioneiro
No Cistema brasileiro
Propôs estágio includente


Não seria o momento
De se educar gerações
Onde o reconhecimento
Seja uma prática sem senões?
Para que o grupo Tê
Possa entrar e perceber
Que não se impõe padrões


Será questão de justiça
Não esconder a história?
Ou vale deixá-la omissa
Dando a outros “a glória?”
Dizendo que o Tribunal
É o primeiro, afinal
Onde o Tê faz trajetória!


Cada qual use a cabeça
E pense com autonomia
Antes que o dia anoiteça
E eu termine esta elegia
Sobre direitos humanos
Que entre lutas e planos
Demanda nossa energia


E a justiça social
Mais “R” tem exigido
Dentro de um mundo plural
Isso faz muito sentido
Seja em Representação
Ou Redistribuição
Reconhecer é preciso!


Assim termino meu verso
Reconhecendo quem luta
Mesmo sendo controverso
E/ou falho em sua conduta
Posto que nem a Justiça
Sustentada por treliça
Tem razão absoluta!

Salete Maria

10 de dezembro de 2023



[1]Decreto judiciário nº 791, de 26 de outubro de 2023. Art. 16 ficam reservadas para pessoas trans (transexuais, transgêneros e travestis) o percentual de 5% (cinco por cento) das vagas oferecidas para o programa de que trata este decreto. Disponível em http://www7.tj.ba.gov.br/secao/lerpublicacao.wsp?tmp.id=32730

 

[2] Comissão para Promoção da Igualdade e Políticas Afirmativas em Questões de Gênero e Orientação Sexual (COGEN).

Uma homenagem Singela à Dona Socorro


 Uma singela homenagem para Dona Socorro Alencar (mãe de Sammyra Santana, amor meu) por ocasião de sua "viagem" para outro plano dessa jornada chamada vida, que  segue fluindo eternamente . Dona Socorro foi uma mulher profundamente devotada a sua família, amigos e vizinhos. O sentido da palavra "cuidar" foi experimentado e exercitado por ela do primeiro ao último dia de sua passagem por este planeta. Além de tudo, foi uma grande educadora da rede municipal e estadual de ensino em Juazeiro do Norte, Ceará, onde também exerceu a gestão da então "Delegacia de Ensino" e Secretaria de Educação, com zelo, rigor, maestria e espírito público. Por essas e outras, tantas pessoas tem testemunhos importantes e inspiradores a dar sobre ela. Neste cordel, meu objetivo foi registrar um pouco dessa caminhada e de minha admiração por essa professora que voltou à Casa do Pai no dia 14/10/2023. Sou grata!

Dona Socorro partiu
Mas seu legado ficou
Pois ela sempre agiu
Como Deus orientou
Zelando pela família
Para além da própria filha 
Pois a muitos agregou

Foi grande educadora
E atuou na gestão
Com garra foi defensora
Da paz e da união
Apostando nas crianças
Deixou-lhes como herança 
A fé na educação

Foi amada e querida
Por quem com ela cruzou
Aproveitou bem a vida 
E a muita gente ajudou
Parte deixando saudades 
E centenas de amizades
Que ela tão bem cultivou

Dentre os frutos que ficaram 
Tem sua filha Sammyra 
E parentes que a amaram 
E a honraram em vida 
Ficam seus ensinamentos
E os melhores momentos
De uma jornada colorida

Siga em paz, Dona Socorro
E obrigada por tudo 
E que Deus, neste retorno
Dê-lhe um abraço graúdo
Pois tu és merecedora
Pois fostes cultivadora
Da paz como conteúdo

Siga na luz, professora!
E tenhas um bom descanso
E que a Mãe-Consoladora
Dê à família o remanso
E com fé e gratidão
Mesmo na separação
Cultive o coração manso

Até outra ocasião
Em outro nível e espaço 
Sua vida não foi em vão
Pois teve régua e compasso
Mas não mediu seu amor 
Pois este lhe transbordou 
E eu lhe devolvo em abraço!

Abraço mesmo distante
Abraço agradecido
Abraço desconcertante
Abraço feito gemido 
Abraço de despedida
Abraço de uma atrevida
Que tem coração partido! 

Abraço de quem confia 
Que Deus contigo está 
Abraço de quem envia
Orações para acalmar 
O coração de tua filha 
Que seguindo a tua trilha 
Foi feita para amar! 

Salete Maria 
Salvador, Bahia
14/10/2023

sexta-feira, 6 de maio de 2022

CHAPA ÚNICA DE NOVO? (brancocêntrica e masculina!)

Imagem: Google Imagens
 


Tá virando tradição
Costume e repeteco
Em tempos de votação
Meu juízo dá um treco
Chapa única de novo?
Ninguém aqui quer renovo?
Saudade do tico e teco!


Outra vez, do mesmo jeito
Dois homens brancos estão
Protagonizando um pleito
Do qual eu tiro lição
E me pergunto o que há
Que faz a gente calar
Diante dessa opressão?


Num lugar onde mulheres
E negros são maioria
Que problema tu aferes
Quando testa a teoria?
Nada é estranho pra ti
Que agora vai aplaudir
O que tanto combatias?


Além de gênero e raça
Que já embola a questão
Seria fazer pirraça
Falar em classe, então?
Ou somos todos iguais?
Dançando nos carnavais
Como empregado e patrão?


E numa comunidade
De cinquenta mil pessoas
Onde a pluralidade
Não é figura de proa
Mas a tal da “unidade”
Que impõe passividade
E só um canto entoa


Por que tem que ser assim?
Quem define esse enredo?
O que há de errado em mim
Que não curto esse brinquedo?
Nem me nutro da peçonha
Que além de causar vergonha
Ainda espalha medo


Medo de questionar
E forjar alternativas
De de-ses-ta-bi-li-zar
Acordos de comitiva
Sombras de autocracia
Falando em democracia
De forma bem incisiva


Tudo isto dá o tom
Do jogo que tá em curso
Do qual faço ultrassom
E revelo o interdiscurso
Do que sempre esteve lá
Mas querem nos ofertar
Como um novo percurso


A mesmice reeditada
Polida e diplomática
É comida requentada
Em esfera burocrática
Que fala em experiência
Pra detonar divergência
Com postura dogmática


E embora nesta empreitada
Outra chapa tenha entrado
De forma desvantajada
Pra desmontar o já dado
O fato é que o sistema
Sustenta todo um esquema
Chamado “jogo jogado”


Que é feito pra expulsar
Quem ousa se intrometer
Já que a ideia é montar
Palco para conceder
A mais plena condição
De gerar manutenção
Pra quem já estar no poder


E entre normas excludentes
E pouca articulação
D’uma turma descontente
Que sofre perseguição
Emergem dificuldades
E também ambiguidades
Que pedem reflexão


Sobre regras e posturas
Sobre discursos e fatos
Sobre pessoas “impuras”
E sobre “seres pacatos”
Que esperam o dia ideal
Ou parceira/o angelical
Pra dar o pulo do gato


Contra autoritarismo
De gestões autocentradas
Contra patrimonialismo
De cultura enraizada
Que gera adoecimento
Revolta e sofrimento
Em gente irresignada


Que se opõe ao mandonismo
De feições modernizadas
E ao neocoronelismo
De cariz amenizada
Que pugna por transparência
Integridade e decência
Mas sofre nessa jornada


Cadê toda aquela gente
Alvo de assédio moral?
Quanta mente inteligente!
Se removendo, ao final
Ante tanta omissão
Dessa administração
Que banaliza o mal


Cadê quem já não aceita
Tratamento desigual
Da galera que se ajeita
Em familismo doutrinal
Com ou sem partidarismo
Só no corporativismo
Que tritura o não-igual?


E os colegas que abominam
As gestões autoritárias?
E que também não combinam
Com posturas salafrárias
O que estão pensando agora
É chegada ou não a hora
De entrar nessa batalha?


Sou capaz de entender
As saídas encontradas
Pois ninguém deve morrer
Em relações esgarçadas
Já que saúde é tudo
Só não vale ficar mudo
Pois não adianta de nada


Como disse Audre Lorde:
“O silêncio não te protege”
É preciso que se aborde
Em posição de herege
Aquilo que nos oprime
Esmaga, isola e reprime
Mesmo que cause um frege


É sabido que é difícil
Enfrentar os tubarões
Mas são ossos do ofício
Nalgumas ocasiões
Recusar continuísmos
E derrotar capachismos
Que nos impõem grilhões


Ninguém está obrigado
A se lançar aos leões
Mas já está comprovado
Que sempre há opções
E não votar é uma delas
Até que nossas querelas
Tenham apreciações


E assim como fazer greve
Também é super legítimo
Não aceitar quem prescreve
Solução por algoritmo
Pois tão importante quanto
É recostar num recanto
Pra respirar no seu ritmo


Recusando o prato-feito
Dos cortes bolsonaristas
Assim como os malfeitos
Da hegemonia esquerdista
Tensionando aqui e ali
Para jamais sucumbir
A quem nos tira da lista


Já que as regras deste baba
São excludentes também
E dão uma grande lapada
Em quem nunca se abstém
De lutar e resistir
Questionar e inquirir
Privilégios que advém


Das relações de opressão
Da divisão de papéis
Dentro da instituição
Que excomunga “infiéis”
Com segregações diversas
Absurdas e perversas
Que causam dores cruéis


Eis a base do processo
Que envolve esta “eleição”
Marcada pelo inacesso
Quanto à participação
De votantes afastados
Remotamente postados
Na presente ocasião


A restrição que é imposta
Não somente em edital
Precisa sim ser exposta
Por ser muito desigual
Pois tá naturalizada
Pela cúpula reitorada
Branca e consensual


Homens no centro de tudo
Se revezando na roda
Tem pequeno e tem graúdo
Todos tidos como fodas
Mulheres na retaguarda
Branca, indígena, preta, parda
O sexismo acomoda


Segregação vertical
Chamada teto de vidro
Mas também horizontal
Como um nicho presumido
No tal “lugar de mulher”
E quem meter a colher
Tem pedido indeferido


Negros só como votantes
Ou cabo eleitorais
Tratados como infantes
Ou vistos como boçais
Mas a tal da inclusão
Permanência e promoção
Não sai da boca dos “pais”


Pois sobre democracia
Tem discursos abundantes
Junto à meritocracia
Que emerge neste instante
Pois em meio a exclusão
De preto e mulher, então
Segue o bonde, esfuziante


E com apoios valiosos
Dos que sempre “representam”
Os discursos respeitosos
Que nada mais acrescentam
Vão rasgando teorias
Rejeitando rebeldias
Que da farsa se ausentam


Pois só há democracia
Onde houver pluralidade
E o fim da primazia
Das mesmas autoridades
Que tomam cargos pra si
Ou para quem lhes servir
Cadê transitoriedade?


Chapa única de novo?
Brancocêntrica e masculina?
Pra alegrar baba-ovo
Que a acolhe como sina?
Falando em democracia
E compondo uma liturgia
Que finge que aglutina


Porém a democracia
Em contexto de gestão
Precisa ser luzidia
E promover inclusão
Afinal qual o sentido
Se negros são preteridos?
E mulheres só alusão?


Não dá pra ser feminista
E não pautar a questão
Ou dizer-se antirracista
E ver tal situação
Com carinha de paisagem
Azeitando a engrenagem
Em nome da união


Pois é possível bater
No governo Bolsonaro
Sem deixar de combater
Patriarcado ignaro
E o racismo acadêmico
Articulado e sistêmico
Que goza de muito amparo


É preciso tensionar
Não somente em artigos
Ou na internet lacrar
Entre tiete e amigos
É no olho do furacão
Que ocorre a combustão
Com ou sem voto vencido


Pois se não há opções
É porque nos silenciam
E nos jogam em porões
Conforme nos avaliam
Espalhando fake news
E impondo desafios
Que tantos descredenciam


Por que que os mesmos grupos
Sempre tem que comandar?
Essa manga eu não chupo!
Fale quem quiser falar!
Não é isto o que eu ensino
No meu labor feminino
Feminista e secular


Seja em Gênero e Poder
Ou em Gênero e Estado
Gestão pública, um ABC
Pra compreender o babado
Seja em Direitos Humanos
Violências questionamos
Privilégios são quebrados


Quem pode achar normal
Essa tal supremacia?
Que não é ocasional
Mas imita dinastias
Onde até na Comissão
Que conduz a eleição
Titular é a androcentria!


Basta de “jogo jogado”
Queremos “jogo jogante”
Pois o primeiro é marcado
E o segundo é transformante
Eis porque eu não endosso
E protesto o quanto posso
Contra o engodo alucinante!


Salete Maria, 06/05/2022

domingo, 1 de maio de 2022

BABADUFBA: PARA DEMOCRATIZAR A DEMOCRACIA ANDRO(BRANCO)CÊNTRICA NA UFBA

Nesta terra de doutores, magníficos reitores, leva-se a sério a comédia? (Belchior)


Esta peça é encenada
No salão da Reitoria
Lugar de gente letrada
Branca, nobre e luzidia
O século é vinte e um
Mas pode ser qualquer um
Pois é contra a fidalguia


A plateia está lotada
Da ralé que chegou cedo
Forasteiras graduadas
Gritando “não temos medo”
O monólogo começa
Com uma atriz boa à beça
Dramatizando o enredo


Ela veste saia justa
E blusa preta de malha
A voz é rouca, me gusta
E o sorriso se espalha
Cheia de dentes, irada
Altiva e desbocada
Mete lenha na fornalha:


“Eis que o momento chegou
Da escolha do reitorado
E o jogo que se armou
Precisa ser questionado
Pois desde o edital
Já temos um bom sinal
De guerra em campo minado

Tardiamente editadas
As normas são excludentes
De feições encomendadas
Porém pouco inteligentes
Pois em plena pandemia
Golpeia a democracia
Com restrições indecentes


Exige que as inscrições
Sejam só presenciais
E não abrem exceções
Pra casos especiais
Mesmo em contexto atípico
O táxon é monotípico
No clube dos maiorais


Do mesmo modo a campanha
E também a votação
Para evitar ‘gente estranha’
Ao ninho do ‘Pai João’
Com chapas questionadoras
Das condutas opressoras
Dos governos de plantão


Portanto só vai votar
Quem puder comparecer
Fisicamente ao lugar
Que a ordem estabelecer
E em cédula de papel
Lavada com álcool gel
Sua ‘vontade’ escrever


Na contramão da história
Ao estilo Bolsonaro
É pra ficar na memória
Do talk ‘Hora do Faro’
Já que em outras IES
Ninguém deixou Ramessés
Impor conto do vigário


Da USP a UNILAB
UEPA e UFC
O mundo todo já sabe
Mas não me custa dizer
Foi on line a escolha
E também furou a bolha
UPE e UFRB


Pra não excluir ninguém
Em tempos de pandemia
Algumas vão mais além
Em nome da isonomia
Fazem tudo virtual
Do sertão ao litoral
Privilégio repudia


Respeitam normas internas
Sobre ensino remoto
Não tentam quebrar as pernas
De quem não anda de moto
Com transparência e lisura
Evitam impor censura
A quem não lhes é devoto


Assim a escolha se dá
Noutras instituições
Mesmo onde disputa há
Entre grupos grandalhões
Mas evitam cercear
O direito de votar
De quem foge aos padrões


Sejam eles citadinos
De gênero, raça e etnia
Com ou sem foco divino
Ou mesmo ideologia
Basta ser comunidade
Pra ter a oportunidade
Sem invocar primazia


Mas na UFBA é diferente
Só vota quem tem dinheiro
Pois um grande contingente
Voltou pra casa ligeiro
De Xique-Xique a Brumado
Tem gente pra todo lado
Cuidando dos seus, primeiro


Pois desde 2020
Estudam remotamente
E chega a ser um acinte
Excluir toda essa gente
Que está matriculada
E não pode ser privada
De escolher dirigentes


Ademais tem servidores
Seja técnico ou docente
Que também são detentores
De direitos inerentes
Que por razões de saúde
Até que o quadro mude
Trabalham remotamente


Estes não irão votar
Posto que a regra os exclui
Já que para sufragar
Ser membro em nada influi
Deve-se comparecer
E continência ‘bater’
Pros seguidores de Rui


Mas quem se importa com isso?
Se temos democracia!
Pois do atento ao omisso
O que vale é a alegria
De votar para reitor
Sumo-pontífice, pretor
Digno de toda honraria


Tutto maschio de esquerda
Branco, em regra, potentado
Se um preto ousa, é perda
Se for mulher, é pecado
A menos que a autorizem
Ou volte para a origem
Com ‘um’ mandato findado


Basta ver as galerias
Das fotos dos reitorados
Branquitude em harmonia
‘Cabelos bem penteados’
Bem-nascidos, educados
Previamente preparados
Pra conduzir o ducado


Assim a cada mandato
E a cada nova consulta
Chapa branca já é fato
E às vezes nem há disputa
Tem ‘consenso’ costurado
Tudo mui bem ajeitado
Com ‘democracia e luta’!


Até que uns revoltados
Resolvem se apresentar
Livres e desenfreados
Ousam tudo questionar
Construindo alternativas
Críticas e propositivas
Pra chapa única evitar


Pessoas independentes
Fartas de perseguição
Afro-pobres descendentes
Feministas sem quinhão
Sedentas por equidade
Transparência e boa vontade
Dentro de fora da gestão


E ao longo de muitos dias
Tentam algo construir
Mas veem que as utopias
Se chocam neste devir
Pois também na resistência
Pululam incoerências
Difíceis de digerir


Egocentrismo aguçado
Bota tudo a perder
Machismo escancarado
Não dá para defender
E a cabeça da chapa
Como bola na caçapa
Só macho pode meter?


E além da desigualdade
Do certame elitista
Emerge a iniquidade
De caráter sexista
Onde o arquétipo viril
Másculo e varonil
Só quer o topo da lista


Assim é que duas chapas
Novamente masculinas
Repetem velhas etapas
Numa IES feminina
Onde somos maioria
Mas reza a ideologia
Que servir é nossa sina


Seja como auxiliar
Assistente do varão
Como vice, até que dá
Mas como reitora, não
‘Venham coadjuvar
Cuidar, secretariar
Mas comandar? Ninanão!


Mas os homens candidatos
Sempre tem apoiadoras
Algumas ‘de fino trato’
Outras ditas precursoras
Da arte de militar
Ou da função de ensinar
Que podemos ser ‘mentoras’


Branco, negro ou amarelo
Titular ou a caminho
Para eles, o Castelo
Para nós, o puxadinho
É assim que a banda toca
E pobre de quem se toca
Pois lhe resta o pelourinho


Porém o continuísmo
Discursa sobre inclusão
E o bloco do oportunismo
Vai na mesma direção
E o patriarcado gozando
Com ambos se jactando
Na dança da sucessão


Mas muitos preferem ver
Somente as maravilhas
Fazem vídeos pra dizer
Como é bela ‘nossa ilha’
‘Democracia não falta’
‘Igualdade é nossa pauta’
‘Rezem por nossa cartilha’


Já o outro diz que é fraude
Mas entrou para jogar
Sabendo que era debalde
Essa farsa endossar
No princípio acreditou
De vices se acompanhou
Pra depois espernear


Aceitar jogar um jogo
No qual nem pode votar
É meter a mão no fogo
Crente que não vai queimar
Bastava não ter entrado
Ou jamais ter apostado
Que poderia ganhar


Sem dúvida que é importante
Ter chapa de oposição
Pra romper com a arrogante
Hegemonia em questão
Mas pra quê jogo de egos
Socando em ponta de pregos
Sem apoio ou condição?


E achar que violência
É ‘só’ pressão virtual
E não vê a virulência
Na traição underground
É ter pouca consciência
Ou mesmo fingir demência
Pra ganhar ponto, ao final


A violência política
Que nós, mulheres, sofremos
Não se confunde com a crítica
À chapa a que pertencemos
É sobre situações
Ofensas, perseguições
Pra que não continuemos


São expressões do machismo
Que podem até matar
E articulada ao racismo
Visa nos interditar
De ocupar o poder
De disputar, concorrer
E até mesmo ganhar


Também sofre quem milita
Por mais representação
Porém já não se limita
Somente à eleição
Ocorre no exercício
(Ao longo do interstício)
Do mandato ou da gestão


Portanto, ao impedir
Ou mesmo dificultar
Que a mulher possa vir
No lugar de titular
E não somente na vice
Para manter a mesmice
Também é violentar


E o mesmo também se diga
Da chapa só de marmanjos
Pois este ardil mitiga
Machismos e seus arranjos
De violência simbólica
Nefasta e monopólica
Porém com papo de anjo


Em ambas situações
Vemos a iniquidade
Patriarcais ambições
Com selo de qualidade
Falando em democracia
Justiça e cidadania
Aceitas como verdades


Tudo naturalizado
Por silêncios feministas
Num contexto conturbado
Cheio de equilibristas
Que ante ao bolsonarismo
Dão férias ao feminismo
E à luta antirracista


E é tudo tão natural
Que até a Comissão
Chamada de Especial
Reproduz essa visão
Ao colocar na suplência
Três mulheres-referência
Em nossa instituição


E assim o baile segue
Só com chapas masculinas
Para quem come esse regue
A festança é na colina
Mas para quem questionar
E não deixar se enquadrar
É sem dó ou vaselina


Mas quem aprendeu lutar
No Raso da Catarina
E não se deixar domar
Pelos que tão lá em cima
Resistir é necessário
Conforme a rima de Bráulio
Do Raio da Silibrina


Porém se a comunidade
Aceita sem contestar
Em uma Universidade
Um certame que não dá
Tratamento igualitário
Aos votantes rotinários
A mim só resta rimar


Rimar pra ter registrada
A posição que assumo
Contra a farsa orquestrada
Que neste cordel resumo
Rimar para resistir
E pra jamais sucumbir
Às normas do suprassumo


Rimar para anunciar
Que não é incompatível
Contra o Bozo lutar
E ser incorruptível
Em certame acadêmico
Elitista, androcêntrico
Excludente e incabível


É possível defender
Democracia de fato
Não só para inglês ver
Ou em discurso abstrato
Ou ela será real
E com direito igual
Ou é fraude e fim de papo


Voto só presencial?
Com disciplinas remotas?
Qual o critério, afinal
De onde essa regra brota?
Privando quem tá distante
E que também é votante
De exercer sua cota?


A noção de inclusão
Permanência e acolhida
Não entra na votação?
Ou dela foi removida?
Afinal, quem pode então
Cometendo exclusão
Propor mais afirmativas?


Farsa, fraude ou restrições
Não podem ser toleradas
Noutras instituições
As regras foram pensadas
Para ninguém ser privado
De votar ou ser votado
Em consultas planejadas


Se o bicho está pegando
Na política brasileira
E tem gente reclamando
Da turma da cumeeira
Por que vamos plagiar
Este modo de jogar
Que normaliza a rasteira?


Eleição pra ser supimpa
Transparente e correta
Primeiro tem que ser limpa
Com regras nada secretas
Onde a isonomia
Seja o prato do dia
Servido a portas abertas


Assim dá pra evitar
Questionamentos futuros
E também facilitar
Um resultado seguro
Legítimo e confiável
Amplamente aceitável
E sem final obscuro


Mas o babado cresceu
E já chegou nos jornais
Na rádio também já deu
Tá nas redes sociais
Só nos resta aprender
Democracia, volver!
Sem deixar ninguém pra trás



E oxalá chegue o dia
De outras vozes falarem
Por outra democracia
Não só com vestes talares
No trono da reitoria
Que venham as ‘minorias’
Com seus blacks e cocares!


Que venham as lesbianas
Crentes e candomblecistas
Faveladas e ciganas
Migrantes, não-binaristas
Camponesas e latinas
Somar com as nordestinas
Numa festa ecologista!


Eita que babado forte
Quando isso acontecer!
Uma gestão de outro porte
É permitido querer?
Ou tem regras pra barrar
Quem ousa imaginar
Algo melhor pra viver?


BabadUFBA seria
O fim da ‘opressão sutil’
Onde a gente não teria
Mais engodo nem ardil
Nem assédios aceitáveis
Privilégios defensáveis
Ou governança hostil


Seria algo assim
Como ter democracia
Só que bem mais inclusiva
E vista à luz do dia
Sendo possível sonhar
Lutar e concretizar
Sem perder a rebeldia


Seria uma pluralidade
De vozes tomando assento
Em outra realidade
Onde ninguém é isento
De assumir que erramos
Quando só homens botamos
Pra governar todo tempo


Aqui termino este verso
Esta peça teatral
Se o assunto é controverso
Vejo como um bom sinal
Pois numa Universidade
Onde há diversidade
O pensamento é plural!”


Cordel de Salete Maria/FFCH/UFBA 01/05/2022