Cordelirando...

sábado, 28 de novembro de 2009

Salete Maria dá mais uma entrevista na blogosfera!


Foi publicada hoje, 28 de Novembro, no blog Coletivo Camaradas uma entrevista com a cordelista Salete Maria, onde a mesma fala um pouco de sua história, dos seus primeiros passos na poesia através da convivência com sua avó, D. Maria José, bem como seu tio José Alexandre, além de tantos outros que tornaram-se suas influências neste caminhar poético.
Na entrevi
sta, Salete fala ainda da temática de suas poesias, geralmente ligada às minorias sociais, mencionando, com muita propriedade, a sua maneira de ver arte+política, sem deixar de citar, claro, a Sociedade dos Cordelistas Mauditos, da qual faz parte e que vem se destacando e sendo objeto de pesquisa por inovarem a literatura de cordel desde sua parte estética até a temática em questão.
Por fim, a poeta fala ainda deste blog, que procura agregar sua obra literária e de suas pretensões para os dias vindouros.
Para ler a entrevista, na íntegra, de Salete Maria ao blog Coletivo Camaradas e conhecer mais um pedacinho de nossa poeta, clique AQUI e depois venha nos dizer suas considerações acerca da mesma.

domingo, 8 de novembro de 2009

Extra! Extra!

Sai mais uma edição dos cordéis "Dia do Orgulho Gay" e "Do Direito de Ser Gay ou Condenando a Homofobia".Trata-se da contribuição político-poética de Salete Maria para o combate à homofobia. Desta feita, os cordéis estão sendo publicados pela ong Galosc, mediante algumas parcerias.

Confira abaixo:

Do Direito de Ser Gay ou condenando a Homofobia


Diante do Tribunal
Zeca expôs a questão:
“Sou um homossexual
E peço vossa atenção
O que deve ser julgado
E d’uma vez extirpado
É o ódio; o amor, não!

Não está em discussão
A minha intimidade
Aqui a acusação
Pesa contra a insanidade
De quem ousa decretar
Que é proibido amar
Invocando a divindade

Meu direito de ser gay
Não me pode ser negado
Pois não ajo contra a lei
Quando ouso ser amado
Por alguém do mesmo sexo
Por mais que seja complexo
Esquisito ou estranhado

Sou eu, pois, um cidadão
Que trabalha e contribui
Com esta grande nação
E que dela não se exclui
Mereço todo o respeito
Sou sujeito de direito
Que avança e evolui

O que temos que julgar
É a tal da homofobia
Que está a provocar
Mortes pela cercania
Privando gente decente
De viver alegremente
Entre nós, em harmonia

Não podemos conceber
Que a injustiça impere
Temos que nos envolver
Pois toda morte nos fere
Todo gay é ser humano
Todo ser é nosso “hermano”
Se pensa assim, não tolere

Não seja condescendente
Cúmplice ou co-autor
Muito menos conivente
Com tais atos de horror
Se você tem consciência
Denuncie a violência
Seja lá contra quem for

Não me chame de demente
Anormal ou acintoso
Nem tampouco de indecente
Pecador ou monstruoso
Ouse atacar injustiças
Reveja suas premissas
Não sou eu o criminoso!

O que há de errado em mim?
E que você não suporta?
Tente escrever outro fim
Para a velha história torta
Um defensor de direito
Não dormirá satisfeito
Omisso, fechando a porta!

A diferença existe
Não adiante negar
Pra que este dedo em riste
Sempre a me apontar?!
Vá julgando a minha vida
E escondendo a ferida
Que tu não ousas curar!

Em toda a Humanidade
Houve gente como eu
Vítima da iniqüidade
Quanto inocente morreu!
Em nome de um modelo
Que sempre imprimiu um selo
Separando tu e eu

Foi assim com outros seres
Igualmente “diferentes”
Ante os “podres poderes”
Continuaram silentes?
Mulheres, negros, judeus
Anciãos, crentes, ateus
São todos eles doentes?

Suplico, reflitam mais
Sobre vossas posições
Examinem os anais
Das vossas “convicções”
Vejam que todos perdemos
Que Justiça defendemos
Admitindo exceções?

Repito: eu sou um gay
Veado, homossexual!
Sou eu um fora-da-lei?
Delinqüente, marginal?
Tenho direito a viver?
Ou minha sina é morrer
Sob a lâmina d'um punhal?

Digam, senhores jurados,
E povo da minha terra!
Quem deve ser condenado?
É este que aqui vos berra?
Ou a tal da homofobia?
Que mata à luz do dia
Vai à missa, ora e enterra?

Eu quero finalizar
Pedindo para os doutores
Comecem a se indagar
Olhem-se nos corredores
Quem não conhece um gay?
São todos foras da lei?
Ou há algum entre os senhores?

Quem nunca teve um colega
Quem sabe até um parente
Aquele a quem você nega
O direito de ser gente
De existir, ser feliz
Ser dono do seu nariz
E levar a vida contente?

Vamos, pensem um segundo!
Antes do seu veredito
Quem aqui criou o mundo?
E tudo o que “está escrito”?
Não é este o argumento?
Que lhes serve de cimento
Sobre o que tenho dito?

Deixo agora com vocês
O direito de julgar
Não é mais a minha vez
Fale quem quiser falar
Condenada a homofobia
Quem sabe por mais um dia
Muitos possam respirar

Sendo ela absolvida
Certamente ouvirão
Dizer que mais uma vida
Foi ceifada no sertão
E também no litoral
Onde gay não é igual
A qualquer um cidadão

Data vênia, meus senhores
Mas isto é covardia
Onde eu for, onde tu fores
Sempre dor e agonia
Ponham um ponto final
Sou um homossexual
Tenho direito ao meu dia!

Dia do Orgulho Gay


“Época triste a nossa em que é mais difícil quebrar um preconceito que um átomo”(Einstein)

No vinte e oito de junho
- Dia do Orgulho gay -
O mundo dá testemunho
Do que não nasce por lei:
É um dia diferente
A rua enche de gente
O marginal vira rei

Tudo fica colorido
A vida enche de graça
Há riso, grito, gemido
Gente se amando na praça
Mas nem sempre foi assim
O vinte e oito, enfim
Surgiu em meio a desgraça

Conta a história, diz Mott
Que um tumulto ocorreu
Num bairro de Nova York
E muita gente envolveu
Stone Wall era o bar
Que à paisana, ao chegar
A polícia enlouqueceu

Ao todo nove soldados
Ali duzentos fregueses
Os donos foram algemados
E espancado, por vezes
Renderam três travestis
Puseram-nas vis-a-vis
Trataram-nas como rêses

Mandaram todos embora
E humilharam os detentos
Mas encontraram lá fora
Os seres mais violentos
O povo enfurecido
Num coro mais que atrevido
Exigiram dos sargentos:

“Libertem estes rapazes
Ninguém aqui é bandido
Saiam, pois somos capazes
Dum protesto decidido
Homossexual é gente
Desumana é a mente
De quem espanca ‘entendido’

Quase uma hora de atrito
No ano sessenta e nove
A polícia com apito
Tudo por causa dum ‘love’
O Estado achando demais
Amor de homossexuais -
Só de lembrar me comove

Surgiu ali o embrião
Duma data mundial
Virou comemoração
Qual a noite de natal
Agora no interior
Tem até vereador
Pelo gay municipal

Esse é o dia de orgulho
De quem sofre a opressão
Dia de muito barulho
E de grande agitação
De bandeira colorida
Para celebrar a vida
O amor e a paixão

Dia de dizer ao mundo:
Respeite a diversidade!
Abaixo o ódio imundo
Basta de mediocridade
A Humanidade é
O gay, o padre, a mulher
Homem de terceira idade

A data exige de todos
Mais amor, mais tolerância
Propõe o fim dos engodos
Exige mais segurança
Direito e democracia
Sossego, cidadania
Respeito e esperança

Por isto no Cariri
Onde tudo nos fascina
Onde a flor de pequi
Desabrocha e nos ensina
O gay tem que se afirmar
Organizado, lutar
Contra a morte como sina

É dever de toda gente
Combater o preconceito
Quem se julgar consciente
Quem quer exigir direito
Jonatan Kiss foi assim
Amou e viveu, enfim
Conquistou nosso respeito!

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

URCA: Caso de Polícia?*


Salve, salve a liberdade
Sobretudo de expressão
Ela é mãe da verdade
Prima-irmã da razão
Venha em prosa ou poesia
Trará sempre à luz do dia
A mais oculta versão

Fazendo revelações
Puxando pela memória
Parindo indagações
Reconstruindo a história
Dizendo o que não se diz
Raspando todo o verniz
Da mais ‘ilustre’ escória

Assim como em oração
Antes de qualquer pedido
É bom fazer saudação
Ao protetor mais querido
Assim farei nesse verso
Que seja ou não controverso
Mas que seja muito lido:

Minha lira nordestina!
Meu Santo Jorge Guerreiro!
Minha nebulosa sina
Tiéte de cancioneiro
Menestréis inspiradores
Trovadores, glosadores
Sirvem-me de candeeiro!

Iluminem minha mente
Neste infeliz enredo
Para que eu, consciente,
Não poupe nenhum segredo
Para que a Academia
Possa dizer algum dia:
Basta, já não temos medo!

Já fiz uns vinte cordéis
Já assumi muitos pleitos
Nunca ganhei um só réis
Eis o meu pior defeito
Mas uma coisa é certa
Sempre dei o meu alerta
Sempre defendi direitos!

Fiz louvores e denúncias
Comprei brigas voluntárias
Tatuei minhas pronúncias
Em bandeiras libertárias
Me somei às margaridas
Em chegadas e partidas
Nessas marchas proletárias

Pus a minha poesia
Para servir de libelo
Daquela dor que doía
Daquilo que não tolero
‘minha estúpida retórica’
Minha arma metafórica
‘palavras pra que te quero?’

Não posso silenciar
Ante tanta bagaceira
Nem posso só lamentar
E viver na pasmaceira
Na luta pelo direito
Aquilo que não foi feito
Causou derrota certeira

Pois bem, vou dizer agora
O que me aflige tanto
E a cada dia piora
Não tem remédio nem santo
É algo muito gravoso
Chega a ser criminoso
Me faz perder o encanto

Mas antes de prosseguir
Usarei um estratagema
Pois vão querer me punir
Me aplicando uma pena
Vou meter uma ficção
No meio desta versão
Pra não dar nenhum problema

“Sonhei que tava num Centro
E um espírito chegou
Me chamou lá para dentro
E me olhando falou:
Anote o que vou dizer
Depois divulgue a valer
E nunca mais terás dor

Eu toda me contorcendo
Doente, acabrunhada
Deprimida, já morrendo
Da URCA licenciada
Pensei: não tenho saída
Se aqui encontro guarida
Terei que ser bem mandada

Mesmo sendo marxista
Senti a culpa cristã
Aceitei aquela pista
Pois pobre não tem divã
O espírito disse assim
Entregue su'alma a mim
E sua vida não será vã

Eu disse: tu és meu dono
E seguirei tua lei
Não me deixe no abandono
Serás pra sempre meu Rei
E ele disse: amanhã
Tu provarás da maçã
Tudo te revelarei

Após comer do tal fruto
Vi tudo com mais clareza
Da vista tirei o luto
Então me veio a certeza:
Este espírito é dos meus
Mil glórias darei a Deus
Ele é minha fortaleza

O espírito disse assim:
Publique aquele cordel
Deixe a bronca para mim
Cumpra logo seu papel
Vão dizer que tu pirou
Que finalmente surtou
Que agora tu és pinel

Conforme me foi soprado
Eu transcrevo a seguir
Tudo me foi informado
Aos poucos fui conferir
Chequei a veracidade
Já não tenho mais idade
Para viver a mentir

Aqui termina a tática
Para não ser processada
Adiante vem a prática
Conforme será narrada
Por meu espírito-sócio
- Quem sabe litisconsórcio?-
Não tenho culpa de nada

Na URCA onde laboro
E tenho muita amizade
Neste lugar que eu adoro
Digo com sinceridade
A coisa tá muito feia
Quem não tem sangue na veia
Não encara esta verdade

Desde que o interventor
Assumiu a reitoria
Desde que esfacelou
A nossa autonomia
Desde que impôs o medo
O que digo foi segredo
Já não é mais hoje em dia

Toda sorte de engodo
Trapaça e falcatrua
Em meio à lama e ao lodo
Ao sol e à luz da lua
Se pratica nesta casa
Escondida em cova rasa
Quase à porta da rua

Trambique, muita mamata
Jogo, conchavo e esquema
Escrito ou não em ata
Igual ou não no cinema
Tudo para atender
Àqueles que no poder
Têm o roubo como lema

Muita irregularidade
Desmando e perseguição
Muita falta de hombridade
Ameaça e demissão
Muitos colegas morrendo
Muita gente adoecendo
Tristeza e depressão

Eis o cenário do medo
A cara da Academia
O bicho que desde cedo
Sua feição escondia
Eis o quadro do terror
‘novos tempos de horror’
Que muita gente temia

Vejam só a s transferências
Ditas como irregulares
Quanta vil conveniência
Auxiliando seus pares:
Caspa e desnutrição
Até piolho é razão
Pra transferir escolares

Por isso a Promotoria
Destemida e operante
Denunciou tal ‘orgia’
Chamada de ‘abominante’
Na esfera federal
Pra evitar que o Chacal
Assedie o judicante

Mas outras coisas piores
Estão pra acontecer
Talvez sejam bem maiores
Do que eu digo a você
Imagine os contratos
Vai haver espalhafato
Ouça o que eu vou dizer

Os cursos de Iguatu
Que bela imoralidade
Eu adverti a tu
Essa pouca insanidade
Quem já viu a URCA ter
Uns cursos para vender
E noutros gratuidade?

Campus sem biblioteca
Professores sem pesquisa
Ficam jogando peteca
Mas que reitor cara lisa!
Um faz de conta total
‘grupo de terceiro grau’
Onde o Rei casa e batiza

E as tais mensalidades?
Pra onde é que elas vão?
Cadê as autoridades?
Doutores da região!
Fogueira de vaidades!
Pululam iniqüidade
Nesta jovem fundação!

Se tem aluno pagando
E caro! Pra estudar
E se ainda está faltando
Até água pra tomar
Não é então o momento
De deixar de fingimento
E tudo isto apurar?

Nunca mais reunião
Nos conselhos acadêmicos
Só pra condecoração
Nada de temas polêmicos
Tudo ad referendum
E a URCA se fudendum
Nesses males não endêmicos

Muitos vícios cometidos
Nos testes de seleção
Muitos discursos não-lidos
Nas festas de colação
Muita gente indignada
Mas tesa, muda, calada
Temendo perseguição

Provas trocadas no dia
De exame vestibular
Seleção pra graduado
Envelope sem lacrar
Candidata pra Direito
Faz um teste tão bem feito
Que engenheira será!

Processos de ascensão
Sumindo de gabinetes
Projetos de oposição
Se perdem qual alfinetes
Pró-reitores muito caros
Resultados muito raros
Alguns são meros enfeites

Muita pompa e muita fita
Muita pose sem trabalho
Quem será que acredita
Eis um jogo de baralho
Quem será que vai bater
Estou pagando pra ver
Mais um ato dito falho

E no curso de Direito
Onde o caos é pior
A coisa ta tão sem jeito
Que às vezes causa é dó
Tem gente com vaga certa
Pois a porta está aberta
Basta ter um paletó

Tem gente que não estuda
E depressa cola grau
A coisa é tão cabeluda
Que agora no Natal
Uma aluna ‘visitante’
Com ajuda importante
Quis se formar, afinal

Mesmo sendo reprovada
Disse que ia mostrar
Pois era orientada
Às aulas não freqüentar
Um ad hoc professor
Suas faltas abonou
E ninguém ia empatar

Depressa o seu pedido
Foi pra mesa do reitor
De fato foi remetido
Pelo seu coordenador
É acintoso demais
Tem que ir para os anais
Porque é fraude e complô

Nas férias qualquer cadeira
Podia se ofertar
Parecia uma feira
Negócio espetacular
Sem ouvir departamento
Sem nenhum constrangimento
Bastava o aluno pagar

Mas como estava demais
E todo mundo mangava
Como não somos iguais
Isto nos envergonhava
Um dia a farra exauriu
Departamento impediu
O golpe que ali se dava

Houve até um magote
Que andou se cadastrando
E dizia que o mote
Era ‘cinquenta pagando’
Pra adiantar o curso
Pois lá havia um urso
Que tava tudo ajeitando

Sei que negócio era feio
Tinha dinheiro envolvido
Aluno no aperreio
Nem era admitido
Isto tudo acontecia
À tarde, à luz do dia
E ninguém era detido

Tem gente que anda armada
Revólver de todo jeito
Uma discussão cerrada
Pode dar tiro no peito
Aluno ou professor
Só de pensar sinto dor
Isto tem que ser desfeito

Um professor que faltava
Por motivos pessoais
Os alunos reclamavam
Pois já estava demais
O senhor coordenador
Os seus nomes anotou
Para não falarem mais

Tinha até um estudante
Que ensinava também
Ele era o informante
E vivia a se dar bem
Está desaparecido
Mas o salário devido
Todo mês na conta vem

Tem colega há dois anos
Gestante e afastada
Acho que ela faz planos
De vir quando aposentada
Tem outro que se ‘enfezou’
E nunca mais trabalhou
Nem lhe aconteceu nada

E nem vai acontecer
Pois estão todos calçados
Se mesmo sem se eleger
O reitor foi empossado
Que moral pensa que tem
Pra exigir de alguém
Que dê conta do recado?

Processo de toda cor
Ameaçam instaurar
Pra perseguir professor
Basta só ele falar
Tem gente que até mudou
De repente amarelou
E nem bom dia me dá

O comitê de pesquisa
Virou de perna pro ar
Muda e ninguém avisa
Que composição terá
Somos todos uns jumentos
Nos nossos departamentos?
Vivo a me perguntar

Toda pós-graduação
Tem confiscado seu crédito
Medida de contenção
Vejam que fato inédito
Faliram a FUNDETEC
Apropriação hi tech
A URCA tá no descrédito

Os alunos do Magister
Reclamam por seus diplomas
Ninguém lhes diz que o gangster
Tá escondendo os sintomas
A URCA virou mercado
Quem não paga é roubado
Deus sabe o vulto das somas

Tem professor aprovado
Em concurso anterior
Que jamais será chamado
Assim diz o interventor
Mas outros são convidados
Sem D.E. e sem mestrados
Para esta gang compor

“Dos juízes sou amigo”
Anda bradando o reitor
Se achando ‘o garantido’
Onipotente feitor
Se perguntar não faz mal:
É do juiz de Sobral,
Magnífico doutor?

Não pense você que isto
Amedronta quem labora
O mal juiz é um cisto
Que se arranca e joga fora
Se o povo não tá contente
Derruba até presidente
Pra tudo se tem a hora

É um caso de polícia
Nossa universidade
Todo mundo dá notícia
Das irregularidades
Se cada um for chamado
Tudo será relatado
Com muita facilidade

Quem sabe uma auditoria
Um inquérito civil
Nisso o povo confia
Exemplos há no Brasil
Quadrilhas são desbancadas
Pois as provas são guardadas
Pelo próprio esquema vil

Enquanto isto não vem
A vida se vai levando
O poder que a gente tem
Vai se manifestar quando
O BERRO for de agonia
E não uma alegoria
De quadrúpede cagando

Sabemos que a URCA tem
Ótimos profissionais
Que de todo canto vem
Que são retos e leais
Que querem colaborar
Ensinar e pesquisar
Viver e dormir em paz

Sabemos que muitos são
Duramente perseguidos
Vivem nesta região
E são bastante queridos
São conhecidos do povo
Querem construir o novo
Sem pisar sobre os antigos

Sabemos que a estudantada
Também não está contente
E que não fica calada
Pois um dia de repente
O grito vai eclodir
Muita gente há de ouvir
‘choro e ranger de dente’

Fica aqui o meu recado
Meu desabafo em cordel
Se cometi um pecado
Um dia não vou pro céu
Mas se dei voz a quem vê
Os desmandos do poder
Então cumpri meu papel

Peço a Universidade
Quem me ajude a divulgar
E a maior autoridade
Que tiver no Ceará
Saberá por poesia
Que a URCA hoje em dia
Tá prestes a estourar

E sendo tudo verdade
Como afirmo que sim
Que alguma autoridade
Mande intimar a mim
Pois direi o que conheço
Mesmo pagando o preço
Por ter agido assim

Se é caso de polícia
Que seja investigado
Se não passa de malícia
Que seja então processado
O espírito que me soprou
E meu dedo que digitou
Texto psicografado

*Cordel escrito pela autora em Maio de 2005. Qualquer semelhança com a atual realidade é mera coincidência (ou não).

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

O QUE É A VELHICE?


Dois velhos filosofavam
Acerca de suas vidas
Sobre tudo comentavam
Amores, dores, feridas
Ela falava baixinho
Ele escutava sozinho
Aquelas frases sofridas:

É sempre muito cruel
O mundo em que a gente vive
Pois o que está no papel
Na prática não sobrevive
O respeito ao idoso
É um assunto jocoso
Demagogo, inclusive

Você tem toda razão
- disse o velho à senhora-
A tal discriminação
É a atitude 'da hora'
A nossa categoria
Jamais ganhou alforria
E a humanidade ignora

Ser velho neste planeta
É como não valer mais
É como uma camiseta
Rasgada à frente e atrás
É viver na solidão
No meio da multidão
Não sendo visto jamais

É como passar batido
É não ser observado
É como ser esquecido
Pelo ente mais amado
É como não existir
É comer e não sentir
O sabor de um guisado

É mesmo muito ruim
O que sentimos agora
Mas nem sempre foi assim
Ao longo de toda História
O velho tinha valor
Sapiência e amor
Status, luzes e glória

Era muito respeitado
Por ser mais experiente
Bastante considerado
Por ser de tudo ciente
Mas perdeu sua importância
Quando surgiu a ganância
Da parte do mais valente

Quando a força se impôs
E os bens materiais
Quando ficou pra depois
O amor e tudo mais
Quando enfim o capital
Deu o passo inicial
O velho não valeu mais

Quando o exército pediu
O vigor da juventude
Quando a indústria exigiu
Braço forte e saúde
Quando o Estado percebeu
O “custo” que o velho deu
Disse: é preciso que mude!

Que nada de experiente!
O velho só atrapalha
Esclerosado e demente
É como uma cangalha
Vamos ter de carregar
Levando a todo lugar
Este resto de metralha

Então o velho deixou
De ser alguém venerado
E bem depressa passou
A ser mui enxovalhado
De respeitada, a velhice
Passou a ser rabugice
E o velho foi humilhado

A tal ancianidade
Foi vista então com desdém
Quem fizesse mais idade
Não seria mais ninguém
Chamar-se-ia antiquado
Obsoleto, quadrado
Arcaico, matusalém

Alguns os chamam trambolho
Fardo, inútil, atrasado
Não põem as barbas de molho
Vivem um tempo parado
Acham que o hoje é eterno
Se julgam sempre moderno
Amanhã serão passado

O culto à mocidade
Que consome, que trabalha
Aos que têm pouca idade
A quem, em tese, não falha
Aos que servem o capital
É o jogo do vil metal
Dessa corja de canalha

O que é velho é remoto
É negativo, é ruim
É qual um álbum de foto
É a ante-sala do fim
Faz parte da neo-cultura
É a porra da sepultura
Por que tem que ser assim?

É certo que é relativo
Nem tudo que é velho é bom
Mas eu falo do ser vivo
E não da caixa de som
O homem que envelheceu
Aprendeu, amou, viveu
Plantou, colheu, deu o tom

A vida não é constante
Tem fases, muda, evolui
A idade é um instante
O tempo ninguém possui
A maturidade vem
Para o mal ou para o bem
Quem quiser que continue!

Ambos foram professores
Cultos, intelectuais
Ela doutora Dolores
Ele, mestre Ernesto Paz
Uma vez aposentados
Ficaram enclausurados
Não souberam viver mais

Naquele dia a idéia
De voltar a pesquisar
Pra entender a epopéia
Do homem ao declinar
Cogitou de teoria
Armou-se de energia
Pr'uma tese formular

Decidiu sair à rua
E entrevistar a massa
Foi uma tática sua
Sentar-se ali na praça
A inquirir quem passava
Sobre o tema que versava
Trabalhava ele de graça

Nesta hora então passou
Um outro casal longevo
Ernesto a eles parou
E disse-lhes: eu escrevo
Um livro sobre o idoso
E quero saber do povo
Se continuá-lo devo

Quero provar que o homem
Não suporta envelhecer
A mal, por favor, não tomem
Este meu (pré) parecer
Mas é que tudo conheço
E respeito então mereço
Pelo que vou escrever

De vocês quero um conceito
Sobre esta condição
Não precisa ser perfeito
Pois vejo limitação
Eu só vou aproveitar
Aquilo que interessar
À minha atual visão

O varão disse: colega!
O tema é muito atual
Envelhecer é uma trégua
Que a gente dá, afinal
Faz parte de um processo
Não sei ao certo, confesso
Se é recomeço ou final

Disse a velhinha passante:
Veja que maravilhoso
Perguntas neste instante
Se meu guarda-chuva é novo?
Como poderei comprar
Se o que recebo mal dá
Pra comer arroz com ovo?

Um outro entrevistado
De meia-idade falou:
Estou muito apressado
Em nada ajudo o senhor
O tema não me interessa
Tô vexado, tô com pressa
Vá consultar meu avô

Uma moça que passava
Disse: a velhice é um saco!
Um jovem que estacionava
Gritou: é o mó barato!
Os velho não vêem nada
A gente rouba a mesada
Eles juram: foi um rato!

Uma criança inocente
Falou: meu avô é lento
Mas ele me dá presente
Quando recebe o “aposento”
Uma madame vulgar:
“Eu sofro só de pensar
Ficar velho é um tormento”

Uma senhora enxuta
Benzeu-se e respondeu:
“Eu enfrento uma luta
Que minha mãe já sofreu
Escondo uma ruga aqui
Um pé-de-galinha ali
Já não reconheço eu”

Mais adiante um rapaz
Disse: eu conheço alguém
O senhor não é capaz
De dizer que anos tem
É uma velha humorada,
Que vive a dar risada
Gozada como ninguém

O mestre se interessou
Por encontrar tal pessoa
Ele a entrevistou
E viu que não era à toa
O jovem tinha razão
Era cheia de emoção
Contava proas e loas

Disse ela sem sermões:
Velha é a serra, a estrada
Envelhecer traz questões
Com mil respostas erradas
Se já não temos vigor
Transbordamos em amor
Mas já não somos amadas

A velhice põe em cheque
Algumas convicções
Já não somos mais moleques
Já não temos ilusões
O presente é o futuro
Somos o fruto maduro
Ao cabo das estações

Costumo ironizar
Com quem caçoa de mim
Gosto de me maquiar
Desde moça sou assim
Meu cabelo agora é branco
Mas não desço do tamanco
Uso roupas de cetim

Eu sei que há diferenças
E há discriminação
Sei que muita gente pensa
Que o velho não tem visão
Eu mesmo cega dum olho
Costuro, cato piolho
Assisto televisão

Tá certo, nada é igual
Uns estão na solidão
Em casa ou num hospital
Em asilo ou em pensão
Mas se a gente não sorrir
Não namorar, não sair
Piora a situação

Se o velho rico recebe
Tratamento especial
E o velho pobre, da plebe
Mal toma um fino mingau
Não vejo o governo agir
Não tenho porque mentir
Vida boa é a de Lalau

Nessa ocasião chegou
Um velho muito janota
Envolto num cobertor
Calçando um par de botas
Olhou o homem e falou:
Eu vou contar pro senhor
Por que fui Rei em Pelotas

Costumo matar charadas
Como serei atrasado?
Se tenho idade avançada
Só posso viver avançado
O povo é meio bilé
Pensa que o velho é
Um doido, um abirobado

Não sou triste como tu
Que é jovem só por disfarce
Se tu tens prega no cu
Também as tenho, na face
Digo que sou sazonado
Macróbio, experimentado
Representante da classe!

O professor encerrou
A gravação e partiu
Chegou em casa e pensou
Em tudo o quanto ouviu
Conclui: que coisa louca!
Velhice é o que sai da boca
Do jovem-mundo-senil

É menos limitação
E mais visão distorcida
É menos saturação
E mais idéia vencida
Ser velho é um conceito?
Não sê-lo é preconceito?
Não sei de nada da vida!

A velhice é o futuro
- o mundo envelheceu-
Quem fez o sexo seguro
Um filho não concebeu
Em breve o mundo será
Mil velhos à beira-mar
Somos ele, tu e eu

Nem todo velho é ranzinza
Nem todo outono é tristeza
Nem toda nuance é cinza
Nem toda falta é pobreza
Nem tudo que é novo é zero
Nem tudo que tenho quero
Nem toda tese é certeza

E para finalizar
A autora faz sua fé
“Preciso homenagear
Uma ‘antiga’ mulher
É minha avó a danada
90 anos de estrada
Salve Maria José!”

O QUE É SER MULHER?

Sobre a mulher já se disse
Tudo que se imaginar
D’uns eu já ouvi tolices
D’outros, me pus a pensar
Mas este ser – a mulher-
Afinal o que é que é?
Quem se atreve a explicar?

É, afinal, a pessoa
Que nasceu pra procriar?
Ou é a esposa boa
Que tão bem cuida do lar?
É a moça delicada?
Ou a menina arrojada
Que sabe escandalizar?

Responda: o que é mulher?
Para que eu compreenda
É alguém que dança balé
E tem no sexo uma fenda?
É a noiva de Tarzan?
Ou é a loira do “Tchan”?
Cujo corpo está à venda

É uma triste donzela
Que mora no interior?
Ou a balzaquiana bela
Que na Playboy se mostrou?
Mulher é filha do cão?
Ou é de Deus criação
Que o diabo cooptou?

Afinal, que é mulher?
Este ser tão contemplado?
Que tão bem faz cafuné
Deixa o homem estimulado
Será alguém que menstrua?
Que não raro fica nua?
Que inventou o pecado?

É mulher quem sucumbiu
Aos apelos sexuais?
É mulher quem nunca ouviu
O grito dos marginais?
É mulher quem noite e dia
Vive combatendo estria
E não luta pela paz?

É mulher quem é omissa
Frente à exploração?
Ou é mulher quem cobiça
Ser amante do patrão?
É mulher quem não resiste
Acha normal e admite
Viver sob a opressão?

Mulher é aquele ser
Que vive para um varão?
Ou mulher pode viver
Com outra mulher, então?
Quem afinal é mulher
Aquela que bate o pé
Ou a que nunca diz não?

Alguém já nasce mulher?
Ou em mulher se transforma?
E se um homem quiser
Então mudar sua forma?
Quem poderá impedir?
Se a alma consentir
Quem pode ditar a norma?

Alguém nesta condição
Terá então que usar saia?
Ou fazer depilação
Sempre que sair à praia?
Combater a celulite
Nunca recusar convite
Antes que o seio caia?

Mulher é quem faz o tipo
Da mulata “globeleza”?
Ou quem arrisca uma “lipo”
E agride a natureza?
É alguém que se enfeita
Mantendo a mente “estreita”
Em nome da boniteza?

Será mulher a gordinha
Que se ama e se respeita?
A negra, baixa, a magrinha
Que como é se aceita?
Ou somente é mulher
Quem o “mercado” disser
Ou por ele for eleita?

Que pergunta melindrosa
Esta que me faço agora
Mulher será a “gostosa”?
Ou a pacata senhora?
Ou mulher então será
Aquela que mais amar
O homem que a ignora?

Parece-me que a mulher
É um ser fundamental
Não é melhor que homem
Convém que seja igual
Não é mero “complemento”
É um “acontecimento’'
Do dito reino animal

Gente como o homem é
Não precisa apelar
E não é por ser mulher
Que melhor governará
A questão é o que pensa
O sexo só não compensa
“Tatcher” taí pra provar

É claro que entendemos
Que existe opressão
O machismo condenemos
Não façamos concessão
Mas no dia da mulher
Responda-me se souber
O que é ser mulher, então?


URCA: 18 de Julho


URCA: 18 de Julho

Foi no 18 de julho
Início da madrugada
Em que se deu o esbulho
Da brava rapaziada
O feitor mandou chamar
A polícia para espancar
Quem não aceita a jogada

Chegou a tropa de choque
E o camburão do GATE
Policial em magote
Deram o seu xeque-mate
A violência espalhou
E o ditador entrou
Conforme narra este vate

Entrou com o aparato
De repressão do estado
Era seu desiderato
Deixar este povo acanhado
Armas, bombas e escudos
Cacetetes e coturnos
Iniciam seu reinado

Era alta madrugada
Estudantes a dormir
Mestres davam cochiladas
Ninguém ousou reagir
Covardemente os soldados
Qual miquinhos amestrados
Mandavam todos sair

Era um ato de cinema
Encapuzados gritando
Um soldado teve pena
Pois também era formando
Disse: “tô cumprindo ordem
alguns latem outros mordem”
Foi logo nos avisando

Os estudantes saíam
Com os braços levantados
Os soldados os seguiam
Todos fortemente armados
Registravam o que convinha
Tomavam tudo que tinha
Tudo foi dilapidado

Quem por ventura passasse
Ali na ocasião
Não duvido que pensasse
Que só havia ladrão
Marginal, estuprador
Latrocida, malfeitor
Traficante e charlatão

Isto pela quantidade
De policiais presentes
Dada a atipicidade
Do grupo de insurgentes
Todos são gente do bem
Valores que a URCA tem
Democratas conscientes

Estavam a defender
O dito na eleição
Ousaram fazer valer
A recente decisão
De que fosse empossado
O que fosse mais votado
Esta é a grande questão

A história vai lembrar
Do dia que a URCA viu
Um ditador desmanchar
Tudo o que se construiu
Um sonho acalentado
De há muito cultivado
Que a força demoliu

Depredou-se a esperança
Danificou-se a utopia
Trincou-se a confiança
Apagou-se a luz do dia
Pichou-se o resultado
Do certame perpetrado
Na manhã daquele dia

Memorável esta data
Por tudo que ela encerra
Deverá constar em ata
Dado o teor da guerra
Golpe na democracia
Viola a autonomia
Aqui no sopé da serra!

Vê-se, pois, um jogo sujo
Onde tudo é normal
Onde uns gritam: eu fujo
Outros gritam: menos mau
Muitos se rendem ao rei
Justificam: é a lei
Quem resiste leva pau

O jogo de que vos falo
É o jogo do poder
Os meus olhos arregalo
Para melhor poder ver
Vislumbro muito desmando
Um ditador no comando
Escreve porém não lê

Após seus 16 anos
A URCA elege um reitor
Toma posse (por engano?)
Um anão interventor
Fantoche da burguesia
Lesou a democracia
Demagogo, usurpador

Por ato de um governo
Que não respeita eleição
Que pratica o desgoverno
Que usa a educação
Que fala em cidadania
Mas só põe na reitoria
Quem reza a sua lição

Acompanhado de seres
Expurgados daqui, dantes
Uns descumpriam deveres
‘Paranóias delirantes’
Cada um tem um passado
Onde fora investigado
Hoje são investigantes

Os chefes que te ajudam
Se gritar não fica um
Pois todos que te saúdam
Não o fazem em jejum
És qual Ali-babá
Há quarenta a te esperar
Nesta lata de atum

Chegastes qual general
Devastando todo mundo
Julgando-se maioral
Com teu projeto imundo
Mas só conseguiu entrar
Pela força militar
Que de ti zomba, no fundo

Rejeitado imensamente
Derrotado no certame
Se julgando inteligente
Ainda há quem te chame
Nesta terra de doutor
Magnífico reitor
Quem morreu talvez te ame

Pensando que esmagava
O sonho estudantil
Ou então silenciava
A quem você perseguiu
‘Ói nois aqui ôtra veiz’
Dando cotoco a vocês
Como o pró-reitor agiu

Trazemos pros estudantes
Notícias de sua história
E de seus acompanhantes
O que guarda na memória
Desmantelo e confusão
Muita esculhambação
Nessa sua trajetória

Só de irregularidades
Se enche um caminhão
Sem contar as inverdades
Desta tua mal gestão
As demissões imorais
E decisões ilegais
Mostram tua intenção

Falavas em novos tempos
E trás à baila impostores
Gente que dá nó no vento
E posam de educadores
A forma que tu entraste
Revela quem te mandaste
E quem são teus assessores

Alguns que a ti veneram
São urubus na carniça
Nem sequer te consideram
Estão aí por cobiça
Se vendem por um real
Iguais a ti, desleal
Choram quando vão à missa

Vede as verbas desviadas
Falta de licitações
Teu governo é uma piada
Faltam muitas demissões?
Quantos hás de perseguir?
Ninguém irá reagir?
Pergunto a meus botões...

Te prepara forasteiro
Que a alma dos Kariris
Há de te tanger primeiro
Que brotem os novos pequis
Se um comparsa te acunha
É só de leve a unha
Do que se guardam pra ti

Hás de provar com certeza
Do teu veneno mortífero
Esta tua esperteza
É qual um germe prolífero
Nada no mundo é eterno
Guarda o teu belo terno
Nem sempre serás mamífero

Com a polícia entraste
Com ela podes sair
A vida é de contraste
Quem chora também sorri
Tudo o que sobe desce
Tudo que é novo envelhece
Etecetera e zefini

Faço este verso irado
Qual o Boca do Inferno
Digo o que ta entalado
Talvez não seja moderno
Mando ao Bêrrêtiçôrrô
A Jurandy professor
Pras Letras mais um caderno

Assino a minha obra
Pois sei dar valor a ela
É o mínimo que se cobra
De quem escreve a novela
Nunca usei pseudônimo
Aqui relato o antônimo
Do que contém na panela

Dedico este cordel
A quem constrói esta Casa
Coloco neste papel
O meu poema em brasa
Gente forte, corajosa
Dedicada, vontadosa
Quem luta nunca se atrasa

Por derradeiro concito
Todos a brindar o dia
Em que ficou mais que dito
Que a polícia invadia
Por ordem do interventor
Com aval do governador
O sonho de quem dormia

Um brinde à resistência
Ao que se chama utopia
À palavra consciência
Também à democracia
Viva o 18 de julho
Dia de muito barulho
Pela nossa autonomia!

“Do rio que tudo arrasta se diz que é violento,
mas não dizem que são violentas as margens que o oprimem”
Bertold Brecht

terça-feira, 1 de setembro de 2009

RESULTADO DO SORTEIO!!

A Campanha+Promoção foi um sucesso! Fizemos o sorteio ontem mas só hoje tivemos como divulgar!
Primeiramente queremos agradecer a todos aqueles que se disponibilizaram a contribuir para a nossa campanhade lançarmos a nossa coletânea. Claro que ainda não conseguimos a grana toda, mas, os primeiros tijolinhos já foram assentados para a realização deste grande sonho!
A solidariedade de vocês em favorecer a cultura regional muito nos sensibiliza e impulsiona a fazer coisas ainda maiores!
Deixamos pra mandar os cordéis de quem comprou só agora depois do sorteio, porque a pessoa sorteada receberia o premio+cordéis de uma vez só (precisamos economizar com os correios, rsrs). então, todos aqueles que fizeram o depósito e escolheram seus cordéis terão os mesmos enviados esta semana (assim que postarmos nos correios, enviaremos um email aavisando, ok?).
Mas vamos ao resultado do sorteio, finalmente! rs

E a vencedora é......
Samya, de Ponta Porã, dona do blog A Senhora das Especiarias!!!!
Parabéns, Samya!

Enviaremos a camiseta junto com os cordéis para o endereço que você nos enviou por email! Esperamos que goste! Foi pintada com carinho!

No mais é agradecer, agradecer e agradecer a todos que participaram!

Quem quiser continuar comprando os cordéis de Salete e contribuindo para a concretização do sonho, é só enviar um email para: salete.maria.cordelirando@gmail.com

Um abraço fraterno a todos e, mais uma vez, muito obrigada!

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Campanha+Promoção: Ajude Salete Maria a CORDELIRAR!

Como fora dito na postagem anterior, os cordéis de Salete Maria se destacam por abordar temas como Velhice, Assédio Moral, Direitos dos Homossexuais, Direitos das Mulheres, Cidadania, Direitos Humanos, dentre outros . O diferencial da autora, além da primazia do verso são as figuras de linguagem, a intertextualidade e o modo como brinca com as palavras, provocando reflexões tão necessárias em nossos dias atuais. Por conta disto, sua obra, que já foi premiada diversas vezes, vem sendo trabalhada em escolas e universidades, além de ser objeto e fonte de pesquisa.
Pois bem, queremos pois lançar uma COLETÂNEA deste trabalho tão lindo e tão importante para todos aqueles que se identificam com as palavras rimadas de nossa poetisa. Mas, para isto precisamos de dinheiro, dinheiro este que (ainda) não temos, infelizmente. E é justamente aí que precisamos de sua ajuda!
Lançamos a Campanha+Promoção: "Ajude Salete Maria a CORDELIRAR!", onde sortearemos, no dia 31 de agosto, esta camiseta pintada à mão (tam. M), que irá dentro desta caixinha também preparada por nós, com todo carinho. Observe as regras de participação:
  1. Compre 10 (dez) cordéis de Salete Maria, no valor de R$1,00 cada (ou seja, R$10,00 ao todo). A cada dez cordéis que você comprar, terá direito a um número para o sorteio;
  2. Acompanhe o nosso blog como seguidor(a);
  3. Escreva nos comentários deste post a seguinte frase: "Eu quero ajudar Salete Maria a CORDELIRAR!" e deixe um email para que possamos entrar em contato e enviar a forma de pagamento dos cordéis;
  4. Se você conseguir a adesão de outra pessoa à nossa campanha+promoção, você terá direito a mais um número para sorteio (basta, para isto, que a pessoa no comentário descrito no item 3, acrescente que foi indicado por você). Cada pessoa que você indicar (e que aderir à campanha) te dará direito a mais um número.
  5. Você poderá escolher quais cordéis deseja comprar. nosso portfólio é o próprio blog, rs.

Desde já, desejamos boa sorte aos participantes e um MUITO OBRIGADA por nos ajudar a difundir esta cultura ainda tão discriminada, mas tão linda e importante que é a literatura de cordel.

Vamos ajudar nossa poetisa a CORDELIRAR e CORDELIREMOS junto com ela!

PS.: Quem não possui blog também pode participar, é só comentar no post e deixar um email para contato, ok?

domingo, 19 de julho de 2009

Extra! Extra!

Extra! Extra! O cordel A História de Zé Leitor, bem como o Cordel Cidadania Nome de Mulher fizeram tanto sucesso que já estão na segunda edição! Viva!
De leitura fácil e didática, os cordéis de Salete Maria têm sido adotados em Escolas de ensino Fundamental e Médio para a discussão de temas pertinentes como aVelhice, Assédio Moral, Direitos dosHomossexuais, Direitos das Mulheres, Cidadania, Direitos Humanos em geral, etc. O diferencial da autora, além da primazia do verso são as figuras de linguagem, a intertextualidade e o modo como brinca com aspalavras.
Caso você também tenha interesse em adquirir os cordéis para uso pessoal ou trabalho em grupo, deixe um comentário neste post com o seu email que entraremos em contato. Vendemos os cordéis a preços módicos.
E sim, Zé Leitor veio de cara nova, olha aí:
Zé recebeu um convite
Que nunca foi feito antes
Pois era coisa de elite
Ou de jovens estudantes
Foi chamado a estudar
Escrever, ler e contar
Quanta coisa interessante!

Ficou meio pensativo
E disse para a mulher:
“Inté hoje eu sobrevivo
Sem sabê lê um papé
Agora nessa idade
Num tenho capacidade
Vou andar de marcha à ré?”

“Já não tenho condição
De aprendê o bê-a-bá
Tenho preocupação
Vivo só pra trabaiá
Agora esta invenção
Estudá, fazer lição
Para mim isto não dá”

A mulher disse: “José
Tu tá com medo de quê?
Sempre foi home de fé
Vai agora esmorecê?
Ta rejeitando a escola?
É direito e não esmola
Conforme ouvi dizê”

“Além do mais hoje em dia
Ninguém mais fica de lado
Aqui pela cercania
Tá todo mundo letrado
Home, muié e minino
Só tu não tá assitindo
O Brasil Alfabetizado”

“O povo qué estudá
Vai atrás e se concentra
Não dá pra desanimá
Na vida tudo se enfrenta
O passado já passou
O presente começou
O futuro a gente inventa”

“É mermo, tu tem razão
-disse José, de repente-
Num vou pagá um tostão
Isto me deixa contente
Vou apanhá um caderno
O mais bonito e moderno
E vou me dá de presente”

“Vou estudá, tá na hora
Vou tentá aprendê lê
Se eu nunca fui à escola
Não foi falta de querê
Desde cedo trabaiando
Meu velho pai ajudando
Levei a vida a sofrê”



“Assim como eu, milhares
Por este Brasil afora
Basta olhá nos olhares
Ninguém mais nos ignora
Eu vou sim, tô na peleja
Nada nos vem de bandeja
É chegada a minha hora”

“Vou tirá o atrasado
Nunca é tarde pra aprendê
Criança fui pro roçado
Hoje não sei escrevê
Mas sei que posso tentá
É tempo de avançá
Chega de teretetê”

A mulher disse: “Você
Já tá falando bonito
Mesmo não sabendo lê
Nada do que tá escrito
Já mostra que tem futuro
Vejo que está seguro
E em você acredito”

“Sei que é um dereito seu
Ter acesso aos estudo
Do tanto que tu viveu
O mundo mudou em tudo
Vá, José, vá estudá
Você só tem a ganhá
Já é um homem sortudo”



“Eu mermo sei lê um tico
Sei fazê um bilhetinho
As vezes até medito
E sonho mais um pouquinho
Se eu voltá a estudá
De tudo vou me alembrá
E progrido ligeirinho”

Zé ouvindo aquilo tudo
De pressa se decidiu
Deixou o olhar sisudo
O coração consentiu:
“Não custa nada tentá
E é tão bom estudá”
Pegou as coisas e saiu

Então foi ele à escola
Cheio de ansiedade
Levava numa sacola
Sonho e realidade
Chegou na sala e entrou
A professora falou:
“Nossa, que felicidade!”

“Seja bem vindo, amigo
Aproveite este momento
Esta escola é um abrigo
Tome logo seu assento
Aqui todo mundo ensina
Cada um é uma mina
Carregada de talento”



Cada um sabe um pouco
Da vida que tá lá fora
Antônio hoje está rouco
De gritar que vende amora
Maria, que é cozinheira
Hoje viu João na feira
Pertinho de onde ela mora”

“Maria Lúcia é avó
Joaquina se aposentou
Eduarda é o xodó
Porque nunca se casou
Socorro é rezadeira
Luís vai à gafieira
E Joana luta judô”

“São todos gente madura
Autoridades no lar
Ninguém aqui tem frescura
Todos querem estudar
Falamos do dia-a-dia
Um pouco da carestia
E de tudo quanto há”

José logo foi gostando
Daquele novo ambiente
Foi logo se enturmando
Achando o povo decente
Olhou em volta e sorriu
À vontade se sentiu
Pois “gente gosta é de gente”



Pegou papel e caneta
Ouviu a explicação
Lembrou da velha marreta
E do surrado macacão
As letras se embaralhavam
Parece até que mangavam
De sua concentração

Espremendo bem a vista
Ouviu tudo direitinho
No quadro tinha uma lista
De nomes bem bonitinho
A professora feliz
Usava um taco de giz
E falava bem mansinho

Tinha um “a” de avião
Um “e” de escadaria
Um “i” de informação
Um “o” de ovo, havia
Um “u” de uva, também
E ele, como ninguém
Naquilo se envolvia

Todo dia ele estudava
Depois de ter trabalhado
A professora falava
E ele compenetrado
Tinha muita explicação
Depois vinha uma lição
Do que fora ensinado



Via os colegas dizerem
Que queriam se formar
Pra uma festa fazerem
E muita gente chamar
Ele até pensava nisso:
“Imagine o rebuliço
Que neste vai dá”

Chegava em casa cansado
Ligava a televisão
Porém ficava espantado
Com tanta complicação
Via que pouco entendia
Pois como ainda não lia
Tudo era confusão

Viu a novela, o jornal
Ouviu notícias do mundo
Mas ao trocar de canal
Adormeceu num segundo
Sonhou com uma caneta
Comandando este planeta
E um papel branco de fundo

“Vixe que coisa medonha
Uma caneta falante
Com uma cara risonha
E em tamanho gigante”
E a caneta dizia:
“Olá, José!” e sorria
E lhe dava um diamante



Sobressaltado acordou
Achando aquilo estranho
De um desenho lembrou
Da forma, cor e tamanho
Olhou para seu netinho
Beijou-o devagarinho
Saiu e foi tomar banho

Achou que aquele sonho
Tinha algo a lhe dizer
Mas era muito medonho
No jeito de aparecer
Pra que caneta e papel
Comandando uma babel
Como podia entender?

Foi trabalhar matutando
E à noite foi estudar
A professora falando
E ele só a pensar
Na caneta e no papel
Sobrevoando o céu
Querendo lhe seqüestrar

Nesta noite nada viu
Que pudesse entreter
Quando da sala saiu
Sem nada ali entender
A professora sentiu
Que ele nada ouviu
E foi sondar pra saber:



“O que há com o senhor
Que nada quis comentar
Parece que não gostou
Da aula, do ensinar”
Ele disse: “não senhora
Eu tava meio por fora
Nada tenho a me queixar”

Ela insistiu: “o senhor
Tava absorto, perdido
Eu lhe peço, por favor
Não se sinta preterido
Se estiver desgostoso
Ou quem sabe ansioso
Pode se abrir comigo”

“Não, senhora, Ave Maria
A aula é muito boa
Me desculpe eu não queria
Ofender sua pessoa
É que eu às vezes penso
Este mundão é imenso
E a vida da gente voa”

“Eu tô aqui nesta idade
Tentando aprendê lê
Pois na minha mocidade
Isto não podia sê
Vivia para o roçado
Ganhando pouco, empregado
Vivendo ao léu, a mercê”



“Por isso mesmo o senhor
Deve dar valor a vida
Se viveu, se batalhou
Se sofreu sua ferida
Deve lembrar o poeta
Que constrói a sua meta
Na palavra proferida”

Diga que “valeu a pena”
Pois tudo vale na vida
“Se a alma não é pequena”
Nela tudo tem guarida
Viva o daqui pra frente
Vale viver o presente
Desta vida comovida

Ele disse: “a senhora
Tá coberta de razão
O que disse só melhora
O meu velho coração
Vou, sim, aprendê a lê
E um dia hei de escrever
Um verso cheio de emoção”

“Com muito afinco e prazer
Meteu a fazer lição
Queria logo aprender
E abrir sua visão
Dizia a sua mulher
Agora eu boto fé
Que serei um cidadão”



No trabalho ele falava
Do mundo que descobria
O servente o olhava
E muito pouco entendia
Mexendo massa e cimento
Só via o mundo cinzento
Por que tanta euforia?

No caderno escrevia
O próprio nome: J-O-S-É
Em voz alta ele lia:
“Jota, ó, ésse e é”
Falava de sua história
Do que tinha na memória
Da vida como ela é

Assim fazia progresso
Mas as vezes se zangava
Quando pegava um impresso
E pouca coisa encontrava
Do mundo em que ele vivia
Pois toda coisa que lia
De outro mundo falava

Ficava desiludido
Com tanta dificuldade
Sentava meio abatido
Contava sua idade
“Já tenho sessenta anos
Eu nem posso fazê planos
De ir para faculdade”




Mas a mulher companheira
Que um pouco sabia ler
Dizia à sua maneira:
“Zé, não se deixe abatê
Tu lendo a tua vida
Melhorando tua lida
Já é bastante o crescê”

Zé ouvia aquilo tudo
E matutava, baixinho:
“Nunca vou tê um canudo
Sempre serei Zé Povinho
Esse negócio de lê
Contá, falá, escrevê
Não é bem o meu caminho”

Mas ao mesmo tempo via
Que muita coisa mudava
Quando ia a padaria
O troco ele contava
Fazia atenta sondagem
Lia toda embalagem
Daquilo que ali comprava

Ao tomar a condução
Ia no transporte certo
Ao receber um cartão
Já entendia correto
Uma ficha preenchia
Um jornal ele já lia
O mundo tava mais perto


Mas algo ele queria
E desejava fazer
Seria naquele dia
Não podia mais conter
Iria ele, afinal
Ao cartório eleitoral
Seu nome subscrever

Queria votar, então
E decidir seu destino
Ao apertar o botão
Não se sentir tão cretino
Queria ver o seu nome
Assinar seu sobrenome
Na folha de papel fino

E assim tudo se deu
Ele se sentiu completo
Vendo ali o nome seu
E não mais “analfabeto”
Que prazer ele sentia
Ate chorou nesse dia
Olhando do piso ao teto

Mas outro desejo tinha
E queria realizar
Faria uma cartinha
Pra seu amor declarar
Diria para Helena
Sua esposa: “Pequena,
não me canso de te amá”



Queria deixar escrito
O que nunca registrou
Num texto muito bonito
Falando só de amor
Queria dizer a ela
Igual se diz na novela:
Você é a minha flor!

Mas tinha aquela vergonha
Podia parecer tolo
Tem coisa que a gente sonha
E a vida passa o rolo
Um homem da sua idade
Falar de amor e saudade
Só tendo cara de bolo

Procurou a professora
E falou do Ceará
Da seca devastadora
Que ele já viu por lá
Disse que tinha um parente
Que gostava de repente
E lhe ensinou a gostar

Disse que nas cantorias
Dos cantadô de viola
Sempre tinha uma magia
Igualzinha a da escola
As palavra vinham vindo
E os verso iam saindo
La do fundo da cachola



Falou que ouviu cordel
Ser declamado na feira
Um poeta, um menestrel
Desses sem eira nem beira
Ensinava o povo lê
Sem grande esforço fazê
Somente na gemedeira

Disse que na sua terra
Tem verso para quem qué
E que lá tem uma serra
Por nome de Assaré
Onde um poeta roceiro
O maió dos brasileiro
Mal rabiscava um papé

O poeta Patativa
Que Deus o tenha no céu
Foi uma ave nativa
Para o país um troféu
Home de pouca leitura
Mas de palavra segura
Partiu envolto num véu

A professora propôs:
Que tal você recitar
Hoje, amanhã ou depois
Do poeta popular
Um verso bem empolgado
Pra lembrar do seu passado
E também do seu lugar?




Que tal você nos trazer
Um cordel para leitura
Para a gente conhecer
Esta augusta criatura:
Patativa do Assaré
Que o mundo sabe quem é
Cheio de força e candura

Zé ficou maravilhado
E disse: Eu trago, sim
Já estou emocionado
É importante pra mim
Lê algo que me encanta
Que minha alma levanta
Obrigado, meu Padim!

E assim foi que se deu
No final daquele ano
Zé, logo que amanheceu,
Já tava fazendo plano
Mas suas pernas tremiam
Os lábios estremeciam
Era grande o desengano

No trabalho mal falou
E o companheiro sentiu
Um aperto o sufocou
Sua voz ninguém ouviu
Tava nervoso, coitado
Não se achava preparado
Pra tarefa que assumiu



Chegando em casa de volta
Da construção que fazia
A mulher viu a revolta
Pois seu olhar não mentia
E disse: Ô meu José
Onde anda a tua fé
Que é tua garantia?

Tá nervoso, acabrunhado
Porque vai se apresentá
Teu terno tá engomado
Eu já vou me arrumá
Quero vê tu recitando
Lendo um verso e comentando
Etecetera e coisa e tá

O medo se agigantava
E José não quis comer
Toda noite ele jantava
Conversava como o quê
Mas nesta noite, tadinho
Mal bebeu um bucadinho
Do chá que mandou fazê

E então todos partiram
Para a comemoração
Os colegas consentiram
Na tal apresentação
José faria a leitura
Dum cordel da criatura
Mais famosa do sertão


Na platéia a lhe sorrir
A mulher e um vizinho
Também estava ali
O servente “Seu Toninho”
Os colegas orgulhosos
Todos muito atenciosos
Para ouvir o tal versinho

Zé foi chamado e aplaudido
Mas só Deus via a aflição
Ela tava tão perdido
Quase golfa o coração
Mas mesmo assim começou
Primeiro ele explicou
Quem foi Patativa, então

Disse que foi O Poeta
Mais sagrado do nordeste
Que sempre foi sua meta
Falar do cabra da peste
E que ficou conhecido
Por ser cantado e lido
Do litoral ao agreste

Sendo assim vou recitá
Um poema conhecido
Vaca Estrela e Boi Fubá
Foi gravado e foi ouvido
Um cantô do Ceará
Em sua voz fez soá
Em tom de pranto e gemido:



I
“ Seu dotô, me dê licença
Pra minha história eu contá
Se hoje eu tou na terra estranha
E é bem triste o meu pená,
Mas já fui muito feliz
Vivendo no meu lugá
Eu tinha cavalo bom,
Gostava de campeá
E todo dia aboiava
Na portêra do currá
È ê ê ê Vaca Estrela
Ô ô ô ô Boi Fubá

II

Eu sou fio do Nordeste,
Não nego meu naturá
Mas uma seca medonha
Me tanjeu de lá pra cá
La eu tinha meu gadinho
Não é bom nem maginá
Minha bela Vaca Estrela
E o meu lindo Boi Fubá,
Quando era de tardezinha
Eu começava a aboiá
Ê ê ê ê Vaca Estrela,
Ô ô ô ô Boi Fubá
III
Aquela seca medonha
Fez tudo se trapaiá;
Não nasceu capim no campo
Para o gado sustentá,
O sertão esturricou
Fez os açude secá
Morreu minha Vaca Estrela
Se acabou meu Boi Fubá
Perdi tudo quanto tinha
Nunca mais pude aboiá
Ê ê ê ê Vaca Estrela
Ô ô ô ô Boi Fubá

IV
E hoje, nas terras do Su
Longe no torrão natá
Quando vejo em minha frente
Uma boiada passá
As água corre dos óio
Começo logo a chorá
Me lembro da Vaca Estrela
Me lembro do Boi Fubá;
Com sodade do Nordeste
Da vontade de aboiá
Ê ê ê ê Vaca Estrela
Ô ô ô ô Boi Fubá”

Todos então aplaudiram
A leitura emocionada
Muitos ali nunca ouviram
O som de uma toada
Ficaram muito tocados
Alguns choraram calados
Naquela noite encantada





A professora Luzia
Disse: Que bela leitura
Pois antes eu não sabia
Da sua desenvoltura
É bom a gente entender
E ver um leitor nascer
Ensinando outra cultura

Vejo que muito de vós
Se desencantam ao ler
Mas cabe sempre a nós
Procurar lhes conhecer
Pois é preciso criar
Formas de estimular
E o neoleitor envolver

Com um poema matuto
Zé mostrou que sabe ler
Ler a vida, ler o mundo
Ler um texto e escrever
Se reconhecer sujeito
Ler e ficar satisfeito
Por tudo ali entender

Escolhendo a leitura
Pelo autor e pelo tema
Mostrou de forma segura
Que aprecia um poema
Que fala do que lhe toca
E emoção lhe provoca
E faz a vida amena



Eis uma boa lição
Que Zé nos deu neste dia
Sua apresentação
Causa gosto e alegria
Estimula a prosseguir
A sonhar e evoluir
Com muita fé e magia

Zé, então, agradeceu
A condição de aprendiz
E tirou do bolso seu
Um pedacinho de giz
E disse: Quero escrevê
Para meus colega lê
O que meu coração diz

Do quadro se aproximou
E rabiscou devagar
A professora notou
Que ele estava a chorar
Uma frase desenhou
Dizendo: “Eu nada sou
Sem Helena a me amar”

Uma colega foi lendo
O que José escrevia
Helena se comovendo
Falar já não conseguia
Toninho, o companheiro
Decidiu-se bem ligeiro
Que também aprenderia



Falou para os presentes:
Eu farei como José
Estamos todos contentes
Vejo agora que da pé
Vou também aprender ler
Contar, falar, escrever
E amar minha mulher

Foi muito contagiante
O momento da leitura
A partir daquele instante
Surgia nova postura
Ficando ali declarado
Brasil Alfabetizado?
Pra todos literatura!

E assim se deu então
A história de Zé Leitor
Não foi contada em vão
Aqui fala o narrador
O nosso objetivo
É dizer que sem ter livro
Não vale o que se plantou

E livro de toda cor
Livro que fale de tudo
Não só livro de doutor
Nem só livro de estudo
Livro para relaxar
Para rir, para chorar
Para cego e para mudo



Que venha livro a mão-cheia
Que venha livro de esquema
Livros fartos para a ceia
Livro de reza e poema
Livro de gente modesta
De guerra, luto e festa
De romance e de cinema

Livro para estimular
A quem aprendeu a ler
Livro para conquistar
Quem não sabia escrever
Livro para abrir a mente
Que deixe a gente contente
E que se faça entender

Que ninguém deixe de ler
Porque não pode comprar
Que o povo possa viver
Literalmente a amar
A nossa literatura
Que representa a cultura
De todo canto que há

Assim então nós teremos
Um Brasil maravilhado
Pois todos nos já sabemos
Como se deu no passado
Poucos nesta terra liam
E quanto menos sabiam
Mas fácil eram enganados



Hoje com a educação
Para jovem e adulto
Não basta terem na mão
Um livro de grande vulto
É preciso estimular
O prazer de estudar
A partir do seu reduto

Aos poucos se vai sabendo
Que somos um universo
Quando se vai conhecendo
O valor que tem um verso
Pois na terra de José
Só se bota no papé
Aquilo em que tá imerso

Literatura em geral
Deve se patrocinar
Desde a cultura oral
Á mais moderna que há
Um blog de poesia
Pra se ler com alegria
Quando já se chegou lá

Por fim, que o Zé Leitor
Possa servir de esperança
E que cada professor
Equilibre na balança
Um pouco de seu saber
E do que pode aprender
Com velho, moço e criança



Que a escola do mundo
Mostre o seu conteúdo
Pois o saber mais profundo
Não se extrai só dum canudo
Que a leitura da vida
Possa ser a preferida
Tal qual num cinema mudo

Zé Leitor é ficção
Mas há na realidade
Abrindo o coração
Se vê José de verdade
Querendo ler um cordel
Ou rabiscando um papel
No campo ou na cidade

É só abrir a janela
E ver a realidade
Nem toda historia é novela
Nem todo choro é saudade
Nem todo texto se vende
Nem toda obra se entende
Nem todo velho é de idade

Nem todo Leitor é Zé
Nem toda obra é de arte
Nem todo pé tem chulé
Nem toda pausa é enfarte
Nem sempre o tempo é perdido
Nem todo escritor é lido
Nem tudo que trinca, parte



Nem sempre a educação
Corrigiu desigualdade
Nem toda proposição
Contempla a diversidade
Nem todo alfabetizado
Lê um texto emocionado
Com amor e sinceridade

Aqui fica o meu recado
Eu que adoro cordel
Se ficou interessado
Por este simples papel
Me manda uma carta, entao
Pois ninguém escreve em vão
Quando o limite é o céu!

ASSÉDIO MORAL: Diga Não!

Você, meu leitor amigo
Que admira o cordel
E o leva sempre consigo
Como importante papel
Sabe que o verso é capaz
De espalhar muito mais
Que tese de bacharel

Às vezes sua leitura
Causa debate e ação
Pois vem da nossa cultura
Folclore e inspiração
Mas pode estar estribado
Em estudo aprofundado
Como nesta ocasião

Eu falarei d’um assunto
Que está muito em voga
Às vezes eu me pergunto
Se não é mais uma droga
O tal assédio moral
Esta mazela, este mal
Que com nossa vida joga

Um tema mui palpitante
Que merece atenção
Vou dizer nesse instante
A sua evolução
Já vem sendo pesquisado
Bastantemente falado
Por toda esta nação

Ouve-se em seminários
Em congressos e jornadas
Em revistas, em diários
Em palestras programadas
Em rádio e televisão
Do litoral ao sertão
Merece grande chamada

Dizem: ‘assédio moral’
É o tratamento aviltante
Que terá como um sinal
Fala desqualificante
Por parte de quem domina
De quem age e determina
Relações já conflitantes

Pode se dá na família
Ou no grupo social
Porém é grande a vigília
No espectro laboral
Onde o risco é perigoso
E o dano insidioso
Falemos dele, afinal

Trata-se de humilhação
Que sofre o trabalhador
Vexatória exposição
Perseguição e terror
Ação grosseira e insana
Fere a condição humana
Dignidade e valor

Porém para discorrer
Sobre esta grave questão
Tivemos que recorrer
A uma dissertação
De Margarida Barreto
Que inspira este folheto
Propondo reflexão

Mestre em psicologia
Médica por formação
Fala em patologia
Fruto da humilhação
Do mundo globalizado
Em tempos neo-liberados
Nova forma de opressão

De leitura obrigatória
A obra dela se torna
Pela forma meritória
Com que bate na bigorna
Malhando o ferro-terror
Das relações de horror
Que a nova era contorna

Estudando o tal assédio
(Ou violência moral)
Ela o fez por intermédio
De situação real
Demonstrou como se dá
E também como enfrentar
Logo ao primeiro sinal

Convidada Margarida
Viajou pelo Brasil
Sempre mui bem recebida
Palestras já proferiu
Militante, abnegada
Comprometida, engajada
Sua pesquisa expandiu

Falou em risco invisível
Este perigo oculto
Do terror indescritível
Que anda ganhando vulto
Terrorismo no labor
Vitima trabalhador
E não merece indulto

Investigando a saúde
Do nosso trabalhador
Analisou, amiúde
A violência e a dor
Jornadas de humilhações
Novas expropriações
Seu texto nos revelou

Pioneiro neste assunto
Seu livro abre caminho
Pra quem queira chegar junto
Pois ninguém está sozinho
Na luta contra opressão
Todos têm igual razão
De depor um pedacinho

No caso particular
Da doutora Margarida
Nada mais fez do que dar
O que deu sempre na vida:
Voz e vez aos humilhados
Adoecidos, calados
De corpo e alma sofrida

Além de livro também
Auxiliou em cartilha
Aos sindicatos convém
Explorar mais esta trilha
Levando informação
Que faça mais alusão
A essa nova armadilha

Vamos, portanto, elencar
Neste modesto cordel
A fim de identificar
Neste fuleiro papel
Os danos e os agravos
Qual no tempo dos escravos
Onde o feitor era ‘incréu’

A ganância pelo lucro
E o abuso de poder
Aponta-se como fulcro
Para melhor entender
Manobras do capital
Deste mundo desigual
Que nos impõe o sofrer

Se dá por meio de chefe
Superior ou patrão
Que aje qual magarefe
Grosseiro, bruto e durão
Incompetente e tirano
Se julgando soberano
Dono de toda razão

Grave estresse gerando
Rebaixamento e vergonha
Degradação espalhando
Ultraje e muita peçonha
Deixando o trabalhador
Abalado e sem valor
Numa depressão medonha

Como se já não bastasse
O mal da exploração
Se o capital não roubasse
Sonho, desejo, ilusão
O medo do desemprego
De ficar sem um arrego
Causa grave anulação

Julgando-se impotente
Com o sono alterado
Se achando incompetente
Sem afeto e desgraçado
Perdendo peso ou ganhando
Tristonho, tenso, chorando
Silente, mudo, isolado

São alguns males causados
Pelas tais humilhações
Já há casos registrados
De drogas e depressões
Um quadro muito pesado
Que urge ser contemplado
Com vistas a soluções

A tirania no trabalho
Visa a auto-demissão
Eis o mais novo atalho
A mais nova ‘operação’
Que o capital encontrou
Descarta o trabalhador
Sem lhe pagar um tostão

Tanto à área de saúde
Como às autoridades
Compete a que se estude
Com maior celeridade
Um meio de coibir
Bem como até de punir
Tamanhas barbaridades

A mencionada doutora
Orienta: não se entregue
A luta é promissora
Busque apoio, não se negue
Conte com as amizades
Ante as adversidades
Diga tudo, não sonegue

Anote as ocorrências
Os dias, as testemunhas
O lugar, as evidências
Os termos e as alcunhas
Desabafe na família
Não queira ser uma ilha
Não fique a roer unhas

Ao médico diga o que sente
Leve o caso ao sindicato
Muitas vezes o doente
Precisa deste contato
Não se culpe, nem se irrite
Gritar com os filhos, evite
Conte ao seu amor o fato

Já existem no país
Em algumas regiões
Várias ações civis
Cobrando reparações
São formas de se lutar
Novas demandas criar
Contra abusos de patrões

O campo Legislativo
Bem como Judiciário
Também o Executivo
Devem entrar no cenário
É um fato social
Questão emergencial
Tema de trato diário

Tanto a luta sindical
(Como o campo do Direito)
Pode apontar um sinal
Propondo norma ou preceito
Tentando, então, reagir
Ensinando a resistir
Enquanto ainda tem jeito

Buscando se auxiliar
‘Do pessoal da saúde’
Tentando estimular
Para que o quadro mude
Lutando pelo direito
Do qual o ser é sujeito
Propondo nova atitude

Em nome do bem-estar
Da paz, da felicidade
Da honra de trabalhar
Mantendo a dignidade
Em nome do ser humano
Da luta que ano a ano
Chama-se fraternidade

Mas em nome, sobretudo
Da igualdade de fato
Contra o esquema sisudo
Desumano e ingrato
Em busca d’outro sistema
Onde labor e poema
Se encontrem no mesmo ato

Dizer não a este assédio
É dever imperativo
Buscar o melhor remédio
Num movimento ativo
Denunciar, reagir
Mobilizar, construir
Enquanto se está vivo.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Semana do Orgulho Gay!

“Época triste a nossa em que é mais difícil quebrar um preconceito que um átomo”(Einstein)

No vinte e oito de junho
Dia do Orgulho gay
O mundo dá testemunho
Do que não nasce por lei
É um dia diferente
A rua enche de gente
O marginal vira rei

Tudo fica colorido
A vida enche de graça
Há riso, grito, gemido
Gente amando na praça
Mas nem sempre foi assim
O vinte e oito, enfim
Surgiu em meio a desgraça


Conta a história, diz Mott
Que um tumulto ocorreu
Num bairro de Nova York
E muita gente envolveu
Stone Wall era o bar
Que à paisana, ao chegar
A polícia enlouqueceu

Ao todo nove soldados
Ali duzentos fregueses
Os donos foram algemados
E espancado, por vezes
Renderam três travestis
Puseram-nas vis-a-vis
Trataram-nas como reses

Mandaram todos embora
E humilharam os detentos
Mas encontraram lá fora
Os seres mais violentos
O povo enfurecido
Num coro mais que atrevido
Exigiram dos sargentos:

“Libertem estes rapazes
Ninguém aqui é bandido
Saiam, pois somos capazes
Dum protesto decidido
Homossexual é gente
Desumana é a mente
De quem espanca ‘entendido’

Quase uma hora de atrito
No ano sessenta e nove
A polícia com apito
Tudo por causa dum ‘love’
O Estado achando demais
Amor de homossexuais -
Só de lembrar me comove

Surgiu ali o embrião
Duma data mundial
Virou comemoração
Qual a noite de natal
Agora no interior
Tem até vereador
Pelo gay municipal

Esse é o dia de orgulho
De quem sofre a opressão
Dia de muito barulho
E de grande agitação
De bandeira colorida
Para celebrar a vida
O amor e a paixão

Dia de dizer ao mundo:
Respeite a diversidade!
Abaixo o ódio imundo
Basta de mediocridade
A Humanidade é
O gay, o padre, a mulher
Homem de terceira idade

A data exige de todos
Mais amor, mais tolerância
Propõe o fim dos engodos
Exige mais segurança
Direito e democracia
Sossego, cidadania
Respeito e esperança

Por isto no Cariri
Onde tudo nos fascina
Onde a flor de pequi
Desabrocha e nos ensina
O gay tem que se afirmar
Organizado, lutar
Contra a morte como sina

É dever de toda gente
Combater o preconceito
Quem se julgar consciente
Quem quer exigir direito
Jonatan Kiss foi assim
Amou e viveu, enfim
Conquistou nosso respeito!
Leia e/ou escute, também, neste blog, os cordéis DO DIREITO DE SER GAY, O GRITO DOS 'MAU' ENTENDIDOS, A HISTORIA DE JOCA E JUAREZ,LESBECAUSE e MARIA,HELENA. E também a entrevista para o site UM OUTROOLHAR. São os cordéis de Salete Maria em prol da emancipação das pessoas.