Cordelirando...

quarta-feira, 8 de abril de 2015

MINHA PRETA, VEM PRA MARCHA!


Quero convocar aqui
A preta que eu mais amo
Pois quero vê-la seguir
Forte e fazendo planos
Depois de muito sofrer
De lutar e de vencer
Exclusões e desenganos

Minha mãe, minha rainha
Musa, estrela e matriarca
Você não está sozinha
Pois essa luta te abarca
Vem para a rua marchar
Vem comigo, vem lutar
Vem cá deixar tua marca

Tu que nasceu no sertão
Lá no sul do Ceará
Que sofreu humilhação
E nunca pôde estudar
Vem somar com as mulheres
Que estão metendo colheres
No que é preciso mudar

Tu que já sentiu na pele
E também no coração
O mal que ainda nos fere
E que provoca exclusão
Vem e traz toda a família
Para engrossar essa trilha
De combate a opressão

Vem exigir do Estado
E de todo cidadão
O que tem sido negado
Geração pós geração
O direito de viver
Plenamente sem sofrer
Tanta discriminação

Vem mamãe, vem para a rua
Vem com outras brasileiras
Vamos lá sentar a pua
E somar com as guerreiras
Que não aceitam racismo
Capitalismo e machismo
Como a única soleira

Vem fazer tremer o chão
Dessa “pátria educadora”
Onde há muita negação
Da cultura encantadora
Da nossa ancestralidade
Estética e diversidade
Afro-índio-genitora

Vem pisar firme na terra
Que sangue negro sorveu
Vem lutar contra essa guerra
Que tráfico não combateu
Mas que tem uma conversa
Cheinha de controvérsia
Onde só negro morreu

Vem por mais cidadania
Por inclusão verdadeira
Por ampla democracia
Por justiça sem fronteira
E pelo fim da matança
De jovem negr@ e criança
Nesta terra brasileira

Vem protestar por saúde
Pras negras deste país
Para que o sistema mude
Da superfície à raiz
Vem pugnar por direito
Dignidade e respeito
E uma vida mais feliz

Vem questionar essa mídia
Que expõe como objeto
Bem diante da desídia
Deste Estado incorreto
Nossos corpos seminus
Visando obter um plus
No seu lucro abjeto

Vem afirmar nossa estética
Contra essa ditadura
Da beleza esquelética
Encarnada na brancura
Dessa visão eurocêntrica
Que considera excêntrica
Tudo que é d’outra cultura

Vem dizer que não é justo
Tanta negra na cozinha
Para manter um vetusto
Discurso ou ladainha
De que somos incapazes
E só brancas são sagazes
Pra ser doutora ou rainha

Vem falar que não é certo
Tu ganhar parca quantia
Pra criar filhos e netos
Com toda essa carestia
E ainda ter que inventar
Bicos para completar
Tua renda a cada dia

Vem contar como é difícil
Enfrentar os tubarões
E entrar nos edifícios
Dessas instituições
Que deviam garantir
O direito de ir e vir
Sem gerar violações

Vem afirmar como é duro
Ter um filho na escola
Que não se sente seguro
E por isso vai embora
Ou mesmo ser um cotista
Ou estudante bolsista
Que muita gente o isola

Vem exigir mais respeito
Por nossa fé e cultura
E também nosso direito
De celebrar à altura
Símbolos e ancestrais
Terreiros e tudo o mais
Que nos serve de armadura

Vem cá exigir o fim
De todo ato racista
Vem pra rua dizer sim
A nossa imensa lista
Que propõe o bem viver
Pois já chega de sofrer
Neste mundo belicista

Vem nesse 13 de maio
Pra grande concentração
Traz também o teu balaio
Lotado de petição
De propostas e pronúncias
De demandas e denúncias
Contra toda exploração

Vem falar das violências
E da triste omissão
Vem questionar as ciências
Que não nos dão atenção
Vem com samba e carimbó
Vem com regue ou com forró
Mas vem com muita emoção

Vem com a literatura
E tua comida caseira
Com tua fé forte e segura
E a erva benzedeira
Vem com sorriso e paixão
Com gosto e muito tesão
Vem gingar na capoeira

Vem que tu é da batalha
Contra a maldade escrota
Vem que teu santo não falha
Pois vejo desde garota
O que pode uma mulher
Preta, pobre e de fé
Quando se junta cas’ôtras

Vem mamãe marchar também
Entre jovens e crianças
Pois tu sabes muito bem
Como tecer esperanças
Como trançar rebeldias
Como atrair energias
Como fazer alianças

Vem mamãe, com teu amor
Teu carisma e teu cuidado
Vem com todo o teu calor
Tua força e o legado
Que vovó deixou pra ti
Nas serras do Cariri
Onde lutar é sagrado

Vem mamãe nos encontrar
E seguir nos ensinando
Com as pretas vem marchar
Até vê-las no comando
Do Estado, no poder
Já que o teu sonho é ver
Uma negra governando

Vem que vem que vem com tudo
Vem mostrar que não és neutra
Vem que o racismo é graúdo
Mas nós tiramos de letra
Vem minha mamãe querida
Vem matriz da minha vida
Vem minha pérola preta!

Salete Maria

Abril/2015

2 comentários:

Nelcima De Morais disse...

Belíssimo poema! parabéns, minha cara!

Unknown disse...

Lindo!!!
Amei!!!
#PARABÉNS